NOTÍCIA

Ensino edição 221

Um convite à concorrência

À frente da Secretaria de Regulação e Supervisão da Educação Superior, Henrique Sartori espera a entrada de novos competidores no mercado para expandir a EAD

Publicado em 13/08/2017

por Marina Kuzuyabu

retranca Secretário Henrique Sartori durante evento realizado pelo Semesp

Ao longo dos últimos dez anos, foram criadas novas tecnologias, ferramentas e metodologias educacionais. O acesso aos dispositivos digitais também cresceu muito, mudando a forma como as pessoas se comunicam e consomem informações. As normas que regem a oferta da educação a distância precisavam, portanto, de uma atualização para acompanhar essas novidades. Essa é a avaliação do secretário Henrique Sartori, à frente da Secretaria de Regulação e Supervisão da Educação Superior (Seres).

Recentemente, Sartori veio a São Paulo para explicar aos gestores educacionais as principais mudanças do novo marco regulatório. O evento foi realizado pelo Semesp e atraiu representantes de centenas de instituições de ensino. A mensagem central de sua fala é a de que o MEC quer desconcentrar a oferta da EAD, dando às instituições com bom histórico de prestação de serviços educacionais as condições para crescer. Confira a seguir os principais trechos da entrevista exclusiva concedida à Ensino Superior.

Por que alterar as normas de oferta de cursos a distância?
Em primeiro lugar, precisávamos atualizar a norma, que já por mais de uma década necessitava de uma revisão. Além disso, havia a necessidade de adequar a educação a distância para com os avanços que tivemos em termos de tecnologias, métodos de ensino, ferramentas de aprendizagem que hoje estão disponíveis para estudantes e professores.

Acredito que o Brasil precisava desse momento de revisão normativa para que a norma não viesse a prejudicar o desenvolvimento da EAD e, sobretudo, o papel que o Estado possui na indução dessas políticas. O decreto trouxe inovações muito interessantes, como o princípio de permitir o credenciamento de uma instituição de ensino superior exclusivamente a distância e a permissão de criação de polos baseada na qualidade institucional. A capacidade de entrega de análise do MEC é muito restrita face à demanda que as IES possuem. Então nós pensamos em premiar pela qualidade. Se a IES possui uma qualidade institucional verificada in loco em sua sede, por que não confiar nesse papel institucional e na proposta que os cursos possuem?

O MEC avançou nesse sentido, de premiar as IES com base no Conceito Institucional. Quanto maior o CI, maior é o quantitativo de polos permitido. O monitoramento e a supervisão nas sedes e nos polos continuam. Nós não deixamos de fazer a supervisão.

Há tempos, o setor também vinha demandando mudanças. A avaliação geral era de que os processos eram muito burocráticos e retardavam a expansão da modalidade. O governo buscou atender a essas demandas também?
Sim. Nós buscamos coadunar as necessidades com as possibilidades. Verificamos as necessidades do setor – sobretudo a do setor regulado pela Secretaria de Regulação e Supervisão –, bem como as possibilidades de avanço – tudo isso sem deixar de lado a questão da qualidade, os pontos de fiscalização e o acompanhamento institucional que nós temos que fazer.

Quais serão os ganhos para a sociedade desse novo marco regulatório?
O novo marco regulatório traz esses avanços que mencionei anteriormente de atualização e também proporciona à sociedade um ganho de acesso. As cidades hoje que não possuem acesso a educação a distância poderão ver esse quadro mudar em breve, por exemplo. Hoje, grande parte das instituições credenciadas na educação a distância possui polos em sua sede; esse é o ambiente de hoje. Mas com a nova normativa, as instituições com atuação local poderão estabelecer uma política de avanço, de instalação de novos polos em suas regiões. Esse é apenas um dos pontos que a gente pode destacar.

Como fazer para que a educação a distância chegue de fato às regiões hoje desprovidas de serviços educacionais?
Hoje os polos estão concentrados em quatro estados: São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Bahia. É claro que esses estados também são os maiores do país em termos populacionais, mas ainda assim há uma grande concentração. A expectativa é que este novo marco regulatório permita às instituições pequenas crescer e concorrer com aquelas que já estão no mercado hoje ofertando esse tipo de modalidade, favorecendo assim a desconcentração. Isso será possível, pois as condições de concorrência melhoraram na EAD. Se for do interesse das instituições, elas poderão crescer.

O número de polos pode dobrar no prazo de um ano se as IES usufruírem o direito de criar, cada uma, ao menos 50 novos polos. Haverá demanda para uma expansão tão grande da oferta?
Há 12 anos, quando a educação a distância ganhou maior ênfase, também se discutia se haveria demanda para a expansão que se iniciava. E hoje nós percebemos que a EAD avançou substancialmente em relação ao quadro que tínhamos há uma década. Fazendo outra comparação, se há 20 anos alguém fizesse uma análise do ensino superior como um tudo, também não acreditaria que chegaríamos ao patamar de hoje, com mais de 8 milhões de matriculados.

Portanto, acredito que há espaço para a EAD avançar e crescer em número de matrículas. Cada vez que nós criamos a possibilidade de o aluno escolher qual modalidade ele quer seguir, novos serviços são colocados à disposição. A educação é muito dinâmica e tem um ambiente muito propício à inovação e à criação de metodologias de ensino. As instituições de ensino agora serão motivadas a ofertar EAD e acredito que o debate daqui a alguns anos será se realmente existem modalidades de ensino.

A liberação do regime de parceria entre IES credenciadas com outras pessoas jurídicas é um dos mecanismos previstos para possibilitar essa expansão da EAD?
A parceria vem para levar os cursos aonde realmente existe demanda, pois agora será possível levar cursos para hospitais, laboratórios etc. Há companhias, empresas que querem ter esse tipo de formação. Mas é importante reforçar que tanto o decreto como a portaria estabelecem que a responsabilidade da parceria é exclusivamente das instituições de ensino no tocante à proposta do curso, ao corpo docente, à oferta de tecnologia.

Acredito que o papel do MEC é observar o ambiente da EAD, mas sem interferir, por exemplo, nos moldes de negócios das instituições de ensino. Claro, nós temos que olhar pela qualidade e coibir a presença de polos em localidades que não se adequem ao ambiente educacional. Mas não é missão do MEC fazer com que as IES optem por um caminho ou outro.

O fato de a avaliação in loco se restringir à sede não representa um risco à qualidade dos polos e, consequentemente, dos cursos a distância?
Concordo que sempre existirão problemas, pois como em qualquer lugar, sempre haverão pessoas bem intencionadas e pessoas má intencionadas. Mas com esse decreto, nós conseguimos – de certa forma com bastante objetividade – atacar esses problemas que sempre existem ou que são corriqueiros no âmbito da regulação. Tiramos o esforço concentrado na análise processual para ganhar fôlego para criar políticas de supervisão, fiscalização e acompanhamento das instituições.

O ambiente normativo anterior amarrava bastante as questões processuais, ao passo que agora, com maior liberdade, nós conseguimos centrar o foco nas campanhas de supervisão, informação e de acompanhamento que essas IES têm que ter por parte do MEC.

A portaria fala que a oferta de cursos superiores a distância sem previsão de atividades presenciais fica condicionada à autorização da Seres. O que será avaliado?
No outro ambiente normativo, esse era um ponto de dificuldade. O setor solicitou a mudança, o MEC avaliou e autorizou a possibilidade dessa formatação de curso, uma vez que entendemos que EAD é a distância por sua natureza. Vamos avaliar a proposta pedagógica do curso e verificar se essa proposta está condizente com as diretrizes curriculares, se ela não fere nenhuma normativa ou resolução colocada pelo Conselho Nacional de Educação (CNE) e se está de acordo com legislação e normativas educacionais. Faremos essa análise que, posteriormente, também m será objeto de avaliação por parte do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep). O processo continua rigoroso, mas abre essa possibilidade para que as instituições apresentem propostas de cursos nesse formato.

O que vai acontecer com os processos de avaliação de polo que já estão em andamento?
O decreto estabelece momentos de transição. Para aquelas instituições que apresentaram propostas de cursos ou de autorizações institucionais de funcionamento visando o credenciamento, estas poderão optar pelo arquivamento da proposta dos polos.

Optando pelo arquivamento, ela vai acelerar ainda mais seus processos, pois deixa de ter a visita polo a polo. A visita se restringirá à sede, mas a IES terá de demonstrar que tem capacidade de ter os polos que pleiteia. Contudo, para não prejudicar nenhuma IES, nós deixamos que elas façam essa opção do arquivamento.

A barreira do acesso à EAD caiu. Como fica o cenário de atuação das IES?
Estamos nesse início de desconcentrar a presença do EAD no Brasil para outras regiões e de fortalecer o papel institucional das IES. Nosso intuito é facilitar a regra do jogo e, ao mesmo tempo, deixar as regras mais equânimes, justas e acessíveis a todos dentro da proposta regulatória. Com o novo marco, não procuramos agradar ou prejudicar nenhuma instituição em particular, mas sim valorizar o histórico e a relevância social das instituições. Queremos que o Brasil possa, em um curto espaço de tempo ou, pelo menos, nesse espaço de validade do Plano Nacional de Educação, atingir as suas metas e que a EAD possa fortalecer o ensino superior no Brasil.

Leia também: O futuro da educação a distância

Autor

Marina Kuzuyabu


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