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Voltar esforços para o atendimento das demandas locais, observar o movimento do mercado de trabalho regional e manter parcerias compõem a fórmula de pequenas e médias instituições de ensino superior para enfrentar a competição no setor por Udo Simons Eram quase oito horas da noite […]
Publicado em 22/04/2013
Voltar esforços para o atendimento das demandas locais, observar o movimento do mercado de trabalho regional e manter parcerias compõem a fórmula de pequenas e médias instituições de ensino superior para enfrentar a competição no setor
Eram quase oito horas da noite quando a entrevista para esta matéria com a diretora acadêmica da Faculdade Nobre (FAN) terminou. “Não me futuque porque quando começo a falar de educação não paro”, provocou com o típico sotaque baiano. De fato, durante quase uma hora de conversa Célia Christina Silva Carvalho não parou, apesar do adiantado da hora e dos próximos compromissos que ainda a aguardavam na agenda daquele início de noite. Enquanto falava sobre sua paixão, a educação, defendeu – com o vigor que a acompanha nos 42 anos ininterruptos de trabalho no setor – a regionalização do ensino superior.
A paixão e vitalidade demonstradas pela diretora da FAN se constituem importantes armas para o negócio da educação superior dar certo num país tão continental quanto desigual. Mas não são as únicas.
O crescimento do ensino superior no Brasil, nos últimos anos, veio também acompanhado do aumento da concorrência e da constituição de grandes grupos educacionais. Fazer frente a um mercado tão grandioso quanto diverso requer estratégias muitas vezes encontradas na própria regionalidade de cada instituição.
No caso da diretora da FAN, a inspiração vem justamente do fato de fazer parte de uma instituição jovem e interiorana, que, nas palavras de Christina, “luta contra o rolo compressor dos grandes grupos educacionais, que tentam e atentam neste mercado”. A crítica da gestora é contra o forte movimento de compra e fusões de pequenas e médias instituições de ensino superior Brasil afora, principalmente, entre as com maior facilidade para alavancar capital.
A posição de Christina é clara face a esse cenário. “Somos acionadores de oportunidades. Somos da terra. Entendemos a necessidade da região e oferecemos uma educação com a cara do nosso povo”, destaca. Segundo ela, são essas qualidades decisivas à oferta da melhor formação educacional.
Olhos na região
Criada em 2001, a FAN oferece hoje 10 cursos de graduação e oito de pós-graduação e está sob o controle do grupo educacional Nobre, que engloba ainda o colégio de ensino fundamental e médio de mesmo nome. Controlado pelos empresários Jodilton Oliveira Souza e Luciano Ribeiro, ambos ex-professores, o grupo possui ao todo 3.900 alunos.
Jodilton ainda mantém o Instituto Nobre de Cardiologia (Incardio) e é o dono do time de futebol da cidade, o Bahia de Feira, que foi campeão do estadual em 2011. Esses dois empreendimentos absorvem alunos egressos dos cursos da FAN, bem como são locais de estágio para os estudantes da faculdade. Com o alcance do grupo ampliado para a área da saúde, a FAN encontrou nessa vocação uma estratégia para consolidação. A grande maioria dos cursos de graduação (60%) está na área de saúde, como biomedicina, enfermagem e educação física.
Além disso, a faculdade também busca outras parcerias para manter seus alunos próximos ao mundo do trabalho da região. “Firmamos parcerias com empresas da região, Rotary Clube e ONGs”, diz Christina, destacando essa interação como um dos atrativos à crescente demanda de alunos.
Estar tão próximo do mercado quanto dos próprios estudantes é outro ponto diferencial das instituições que querem se manter fortes na sua região. No caso da FAN, o compromisso está no projeto pedagógico personalizado e ensino personificado. “Estudei numa universidade na qual sequer vi o reitor. Aqui, é diferente. Temos um compromisso com o aluno firmado no olho a olho”, conta Christina.
Essa característica, contudo, faz com que, frequentemente, a gestão enfrente o embate do departamento financeiro porque, afinal, uma administração tão personalizada também tem custo elevado. Por outro lado, a compensação vem através dos resultados obtidos no ensino. “Atingimos o dobro da média nacional de aprovação na OAB com nossos alunos do curso de direito”, comemora Christina. justificando o reflexo da “acolhida” a cada um dos estudantes e acompanhamento da evolução do aprendizado individual.
Além do ensino
Além de ter o aluno como o principal ativo do negócio, desenvolver outros serviços no âmbito da produção de conhecimento também corrobora o fortalecimento da instituição. Essa é a estratégia adotada pela Faculdade de Estudos Avançados do Pará (Feapa). “Há uma efetividade muito grande à estratégia de negócio quando se realiza uma gestão integrada, quando se oferece prestação de serviço às empresas, em forma de consultorias, pesquisas e afins, quando se consegue capacitar a força de trabalho no mundo corporativo”, salienta o diretor administrativo da Feapa, Édson Franco Junior.
A Feapa foi criada em 2000 e desde 2009 é mantida pelo Centro de Estudos Avançados do Pará (Ceapa), de propriedade da família Souza Franco, a qual agregra ainda a Universidade da Amazônia (Unama), a Faculdades Integradas do Tapajós (FIT) e outros dois colégios de ensino básico.
Nos quatro anos de administração da família algumas mudanças foram nítidas. Em 2009, por exemplo, a Feapa mantinha parceria com seis empresas. Atualmente, são 234 parcerias. A instituição tem sete cursos de graduação distribuídos entre as áreas de humanas e exatas; e sete cursos de pós-graduação com ênfase na gestão pública e empreendedora. A mudança de estratégia foi visivelmente benéfica para a instituição que, segundo Édson Franco, registrou um crescimento de 15% no último ano.
Na opinião de Édson, o ensino superior tem três patrões. “O Ministério da Educação, o discente e o mercado. E a gestão de uma instituição tem de atender aos três.”
É esse o pensamento que norteou a gestão da Feapa para constituir a sua Comissão Permanente de Avaliação (CPA) e atuar em diversas frentes. A cada semestre, além de pesquisas que apontam o nível de satisfação do aluno referente às aulas e professores, a comissão busca saber quais são as demandas prementes no mercado de trabalho. “Definimos esse modelo de ação para atingirmos os melhores resultados nos indicadores do Enade. Antecipamos as pendências do exame para, em tempo adequado, as solucionarmos junto aos alunos antes de eles se submeterem às avaliações de qualidade”, explica Édson.
Como um dos resultados práticos da CPA, a conclusão foi de que, na prática, o aluno quer saber se o professor é bom em sala de aula; o MEC, se esse professor tem titulação condizente; e o mercado, por sua vez, quer estudantes com determinadas habilidades e competência profissional. “Entender isso nos garante sobrevida nesse momento de acirrada concorrência, uma hora tão difícil para as instituições como essa”, garante o diretor da Feapa.
A “hora difícil”, relatada por Édson, surge, entre outros fatores, da ebulição do mercado resultante da vazão à demanda reprimida de estudantes e do interesse dos grandes grupos de estar presentes em diversas áreas do país. Como os grandes têm maior facilidade de captação de recursos financeiros, restam às pequenas instituições alternativas de financiamentos públicos (como por meio do Fies) ou linhas de crédito bancárias.
Na opinião de Édson, o Sistema Nacional de Avaliação do Ensino Superior (Sinaes) e a exigência da realização do Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (Enade) também não colaboram para o funcionamento das instituições de pequeno ou médio porte. A reclamação se deve, especialmente, pelo fato de o processo avaliativo vigente ignorar as diferenças inerentes entre grandes e pequenos estabelecimentos educacionais, exigindo condições similares a todos.
Ajuste ao mercado
Em Piracicaba, cidade no interior paulista, distante 165 km da capital, o diretor da Faculdade de Tecnologia de Piracicaba (Fatep), Marcos Antônio de Lima, planeja iniciar, em 2014, dois cursos de graduação em engenharia de produção e civil. A iniciativa chama a atenção pelo fato de os cursos serem de bacharelado, foco distinto do adotado até agora pela instituição, baseado no ensino tecnológico.
“Precisamos mudar a estratégia de negócio se quisermos nos manter no mercado”, reflete Marcos. A necessidade de mudança, segundo o diretor da Fatep, também está relacionada ao sistema de regulação do MEC, o qual é pouco ágil no processo de autorização de novos cursos tecnológicos. “Ele inibe a agilidade da instituição em atender à demanda do mercado”, critica. Como a formação tecnológica responde às necessidades específicas do local onde as instituições estão, a rigidez do processo acaba impedindo o atendimento das demandas pontuais da região, deixando as instituições com menor oportunidade de mercado.
Após seis anos de existência da Fatep, Marcos se lembra saudoso do início “apoteótico” da instituição, época em que a inadimplência registrada não chegava a 5%, bem diferente dos dois dígitos de hoje em dia. Outro complicador para a gestão da instituição foi o despertar da concorrência para essa fatia de mercado. “A concorrência demorou a perceber o potencial da região para a formação tecnológica”, diz.
As dificuldades fizeram com que a Fatep adotasse uma estratégia de gestão mais enxuta e, sobretudo, com foco nos alunos, que hoje correspondem a 800 estudantes na graduação e 350 na pós. Dentre os cinco atuais cursos da graduação, destaque para os de produção sucroalcooleira (vocação da região) e o de produção industrial (setor de base). “Os dois cursos de engenharia idealizados para o próximo ano contemplam exatamente a demanda desses dois setores, fortes na região”, revela o diretor.
Piracicaba se desenvolveu a partir das plantações de cana-de-açúcar, ainda relevantes para a saúde financeira da cidade e de seus 367 mil habitantes. Hoje, contudo, a economia do município se diversifica. Um exemplo é a implantação, em 2012, da primeira fábrica brasileira da montadora sul-coreana Hyundai (com um investimento de US$ 700 milhões). Além de gerar dividendos para a cidade, na forma de impostos, e propiciar uma nova demanda local de trabalho, esse movimento, consequentemente, oferece mais oportunidades para a expansão da educação na região.
Fortalecimento conjunto
Para a Associação Brasileira de Mantenedoras do Ensino Superior (ABMES), a permanência no sistema educacional das pequenas e médias instituições é um dos grandes desafios do segmento particular de ensino, especialmente por conta do aumento da competitividade neste mercado. As rígidas normas de avaliação e regulação, que, entre outros fatores, desconsideram a heterogeneidade e complexidade de cada estabelecimento, também são apontadas pela associação como fortes empecilhos à manutenção das pequenas instituições.
Outro problema é a falta de um diagnóstico preciso que contemple justamente as peculiaridades de cada instituição e o contexto regional. Até agora, as informações mais abrangentes constam do Censo da Educação Superior divulgado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). Segundo o Censo, as pequenas e médias instituições representam mais de 70% do total do ensino superior privado no Brasil; possuem 17% das matrículas e 27% dos cursos.
“O futuro dessas instituições passa pela resposta às suas demandas locais. Como dizia o geógrafo Milton Santos: ‘é preciso ouvir o território’”, pondera a diretora acadêmica da ABMES, Cecília Horta.
Nesse sentido, a associação busca traçar um perfil das pequenas e médias instituições, a fim de vislumbrar um plano estratégico comum para o desenvolvimento do setor. O relatório com o diagnóstico das pequenas e médias instituições de ensino superior deve ser lançado no segundo semestre.
Enquanto isso, a ABMES preparou um guia para auxiliar as pequenas instituições a se posicionarem melhor para não serem engolidas pelo mercado. O plano começa a ser traçado a partir das respostas ao questionário e da análise de uma relação de pontos que denotam força, fraqueza, ameaça e oportunidades à instituição.
Tendo identificado o potencial da região, empreendido parcerias e maior proximidade com o mercado, estratégias aliadas a uma boa gestão, as pequenas e médias instituições ainda seguem lutando pelo seu espaço no setor educacional. “Dentro desse contexto, sobreviverão instituições detentoras de um projeto político-pedagógico institucional bem estruturado. Aquelas com um corpo docente qualificado e, sobretudo, que ofereçam cursos para atender às necessidades locais”, prevê Cecília. Na opinião da diretora, o importante papel social que essas instituições desempenham nos lugares mais remotos do país, onde a carência da população e a baixa rentabilidade não atraem a fixação de grandes grupos, é o principal argumento para que o espaço para os pequenos estabelecimentos seja preservado.
Guia para identificar o lugar da instituição no atual contexto de mercad |
Questionário estratégico • Qual é o seu papel no contexto local e regional? Quais são os principais obstáculos (fraquezas, ameaças)? • Quais são as estratégias de permanência no sistema (forças, oportunidades)? • Quais são os impactos dos processos de avaliação externa e de regulação na organização e dinâmicas das instituições?Características de força nas instituições • Planejamento estratégico nas áreas administrativa e acadêmica; • Projeto político-pedagógico consistente; • Infraestrutura adequada; • Corpo docente qualificado; • Imagem institucional de qualidade; • Tradição no ensino; • Incentivo à produção científica; • Estrutura com capacidade de expansão; • Cursos que atendam às demandas locais e regionais; • Prestação de serviços à comunidade. Características de fraquezas Ameaças à instituição Oportunidades |
Joia da coroa |
Feira de Santana, onde a FAN está localizada, está a 108 km de Salvador (BA). É a segunda cidade mais populosa do estado baiano e a maior do interior nordestino em população. São 416 mil habitantes, de acordo com o último censo do IBGE. Historicamente, é considerada capital da maior região metropolitana do interior do Nordeste, que engloba seis cidades alcançando 686 mil pessoas. A reputação do poderoso centro urbano vai além, sendo referência política, educacional, tecnológica, econômica e imobiliária no estado baiano. A região é considerada ainda um entroncamento industrial e comercial do interior da Bahia, influenciando outros 54 municípios que a cercam. Juntas, as cidades de toda a região possuem mais de dois milhões de habitantes. É esse contingente o público da FAN, e são as características da região de Feira de Santana que tornam a instituição uma joia da coroa para grupos educacionais que objetivam marcar presença nessa pujante área. |