Recife inaugura escola de alta tecnologia com foco no aprendizado independente
Publicado em 10/09/2011
A começar pelo visual divertido do prédio: todo branco, com janelas de molduras supercoloridas. Laranja, vermelho, roxo, azul-turquesa e verde-limão – tons vibrantes como os das telas do pintor modernista pernambucano que empresta o nome à escola. O colégio funciona em período integral, das 7h30 às 17h. Os alunos fazem três refeições ao longo do dia. Na grade curricular, além das disciplinas tradicionais, constam um segundo idioma estrangeiro (espanhol) e filosofia.
O Grupo Telemar, por meio de seu instituto de responsabilidade social, investiu R$ 6 milhões na construção do prédio de 4,4 mil metros quadrados, na compra e instalação de equipamentos e mobiliário, e no desenvolvimento de uma metodologia de ensino inovadora, concebida pelo educador Antônio Carlos Gomes da Costa.
Outros R$ 6,8 milhões ficaram a cargo do governo de Pernambuco, que cedeu o terreno no bairro de Boa Viagem e assumiu os gastos com a manutenção do prédio e o pagamento dos funcionários. Os R$ 100 mil restantes foram pagos pelo Instituto de Co-Responsabilidade pela Educação (ICE) para a instalação do laboratório de ciências.
“O prédio foi construído em quatro meses, tempo recorde no Estado”, elogiou o então governador Jarbas Vasconcelos (PMDB) no dia da inauguração.
Esse resultado só foi possível, disse, graças às parcerias estabelecidas entre o poder público e as entidades de responsabilidade social da iniciativa privada.
Neste primeiro ano, o CEE Cícero Dias atende 187 estudantes do primeiro ano do ensino médio, divididos em cinco turmas. Estas, por sua vez, diariamente redivididas em times de aprendizado.
Em 2007, quando esses jovens estiverem na segunda série, serão abertas novas turmas de primeiro ano e, assim, sucessivamente. “Como se trata de um programa experimental, a intenção é formar secundaristas que tenham passado todo o ensino médio na escola”, explica Samara Werner, gerente do Instituto Telemar.
“A escola é ótima”, afirma a aluna Thaynah Leal, de 14 anos. Ela já se candidatou para participar da criação de uma rádio e um jornal na escola. “Aqui, a gente é ensinada a atuar como protagonistas.” A menina repete o vocabulário usado pelos professores na apresentação do plano pedagógico aos alunos.
Segundo o Instituto Telemar, o modelo de ensino proposto é sustentado por um tripé pedagógico: “educação para valores” (ênfase na responsabilidade e na solidariedade), “protagonismo juvenil” (o aluno deve ter uma postura ativa no processo de aprendizado) e “cultura para trabalhabilidade” (formação de jovens autônomos e competentes).
O projeto físico é assinado pelo escritório carioca Oficina de Arquitetos.
O prédio foi construído em módulos, que permitem diferentes configurações.
As salas de aula, chamadas de “espaços de aprendizagem”, têm divisórias removíveis e podem ser aumentadas sempre que necessário. O mobiliário ergonômico, criado pela Índio da Costa Design, é também modular.
União para a força – A escolha de Recife para implantar a unidadepiloto do programa Conexão Escola se deve ao fato de haver uma experiência similar em Pernambuco, desenvolvida por meio do Procentro, programa estadual de estudo e legalização de soluções para o ensino médio.
Laboratório de ciências da unidade-piloto: ferramentas digitais possibilitam atualizar conhecimentos e criar rede para trocas de experiências |
O Instituto Telemar pretende repetir a experiência do programa Conexão Escola em outras quatro capitais brasileiras, ainda a ser definidas nos Estados em que a companhia mantém negócios.
O Conexão Escola propõe um plano pedagógico mais que interdisciplinar – “interdimensional”. As dimensões em questão seriam o logos (razão), o pathos (sentimento), o eros (corporalidade) e o mythos (espiritualidade), trabalhados de forma concomitante, equilibrada e harmônica, como explica a gerente Samara, citando o professor Antônio Carlos.
Aula para a vida – A idéia é que o aprendizado se torne um hábito cotidiano, um jeito de viver. Para tanto, explica ela, é necessário que o aluno entenda como se aprende (autodidatismo), como se ensina (didatismo) e como se constrói o conhecimento. Vira, ele mesmo, um iniciado em pedagogia.
“Assim, o jovem será capaz de transformar e renovar a família, a comunidade, a cidade e, virtualmente, o país e o mundo, enfim.” O conceito de turma cede lugar ao de time – grupos com 11 alunos desafiados e estimulados pelos professores.
Em vez de livros didáticos predeterminados, os estudantes usam guias de aprendizagem, para que possam recorrer a jornais, bibliotecas, midiatecas e, claro, à internet em busca do conhecimento proposto.
Thaynah Leal, de 14 anos: “Aqui, a gente é ensinada a atuar como protagonistas” |
De junho a dezembro de 2005, 60 professores foram capacitados pelo professor Antônio Carlos para essa nova proposta pedagógica. Desses, 13 foram selecionados para o CEE Cícero Dias, além de outros cinco profissionais das áreas de comunicação, psicologia, assistência social, mídia-educação e tecnologia.
Para Samara, a tecnologia é um trunfo quando combate a evasão escolar.
“Ela torna o aprendizado mais dinâmico, prazeroso e sintonizado com o mundo contemporâneo”, diz.
Trunfo também para a qualificação continuada de professores e gestores escolares. “Por meio de ferramentas digitais, é possível atualizar conhecimentos, criando uma rede para trocas de experiências.” A professora Ana Maria Pádua, diretora do CEE Cícero Dias, destaca que o conceito de ensino-aprendizagem vigente na escola vai além do campo cognitivo: a idéia é estimular, em conjunto, competências produtivas, de auto-estima e de relacionamento.
Um desdobramento dos quatro pilares propostos por Jacques Delors – ser, conviver, fazer e conhecer. “É uma educação que busca dar significado e sentido à existência.” Quase não houve faltas nesses primeiros dois meses e meio de aulas.
QUESTÃO DE GEOGRAFIA
A localização do CEE Cícero Dias no bairro de Boa Viagem, em região nobre de Recife, pode comprometer o potencial inclusivo da unidade. O principal critério para seleção dos estudantes, definido pela Secretaria Estadual de Educação, é morar perto da escola.
Alguns alunos entrevistados afirmaram vir de colégios particulares e já ter contato regular com computador e internet. É o caso de João Carlos Araújo Fernandes Júnior, de 14 anos. “A informática é o meu hobbie.” Ele diz que a infra-estrutura tecnológica do Cícero Dias é “bem superior” ao do colégio pago em que estudou no ano passado.
A familiaridade de alguns alunos com a tecnologia é confirmada pelo encarregado do laboratório de informática da Cícero Dias, Paulo Henrique Souza. “Já me perguntaram até se vamos dar aula de Delfi e programação.” Para o Instituto Telemar, a localização não é tão determinante assim.
“Não fizemos um mapeamento, mas sabemos que a grande maioria dos alunos é de famílias de baixa renda e vem de outras escolas públicas”, afirma a gerente Samara Werner. O terreno foi doado ao governo pernambucano pela Aeronáutica.
LUGARES PARA CONHECER
O CEE Cícero Dias é organizado em espaços temáticos. Confira os principais: ESPAÇOS DE APRENDIZAGEM: nome dado às salas de aula. Ambientes modulares e articulados, com espaço mínimo de 70 metros quadrados.
ESPAÇO DE ACESSO AO CONHECIMENTO:
local onde funciona a midiateca, com livros, computadores, jornais, revistas, vídeos e DVDs.
ESPAÇO CIÊNCIA:
laboratório químico, físico e matemático.
ESPAÇO ARTE:
ateliê para atividades artísticas, com mesas, bancada e pia.
ESPAÇO MÍDIA-EDUCAÇÃO:
reúne os estúdios de vídeo e rádio.
ESPAÇO CONEXÃO:
laboratório de informática, com capacidade para 50 computadores.
ESPAÇO ACOLHIMENTO:
área reservada às salas de psicologia e assistência social.
OUTROS EXPERIMENTOS
Conheça outros programas desenvolvidos pelo governo pernambucano para a educação, em paralelo aos Centros de Ensino Experimental: SE LIGA PERNAMBUCO Parceria com o Instituto Ayrton Senna e a ONG Empresários para o Desenvolvimento Humano, estabelecida em 2003. O objetivo é alfabetizar crianças de 8 a 14 anos, para corrigir distorções de idade e série. Eles aprendem em salas especiais, com no máximo 25 alunos. Em 2004, 12,9 mil estudantes de 46 municípios participaram do programa. O programa foi ampliado neste ano – agora, são 117 municípios, e cerca 21 mil alunos.
ALFABETIZAÇÃO CIDADÃ
Versão do programa Se Liga Pernambuco para jovens de 15 a 24 anos, que estavam fora da escola. Cerca de 50 mil estudantes já retomaram os estudos. A meta do governo estadual é chegar a 200 mil até o fim do ano.
ESCOLA ABERTA ESCOLA ABERTA
Fruto de parceria com a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), firmada em 2000, o programa oferece atividades de lazer e cultura fora do horário de aula a 100 mil jovens de 455 escolas estaduais. Uma pesquisa da Unesco averiguou que o índice de violência caiu 54% nessas escolas.
RUMO À UNIVERSIDADE
Desde de 2001, 24 mil estudantes da rede estadual de ensino vêm recebendo aulas extras nos fins de semana para o vestibular, além de uma ajuda de custo de R$ 50 por mês. No total, 130 professores trabalham no programa. Em 2004, foram incluídas aulas de espanhol no cursinho.
ESCOLA DEMOCRÁTICA
Há cinco anos, alunos, professores, pais e funcionários escolhem, por eleições diretas, os diretores das escolas públicas estaduais.