Educação

Colunista

Glauson Mendes

Mentor em Marketing Educacional

Marketing educacional: cultivar excelência, inovação e impacto duradouro

O trabalho no marketing não se encerra quando o processo de captação de alunos é finalizado

marketing educacional | foto: Freepik Marketing Educacional é uma estratégia de gestão

Quando perguntam sobre minha área de atuação profissional, muitos se surpreendem ao ouvir educacional acompanhando o termo marketing. “O que exatamente é marketing educacional? Como ele difere do marketing convencional? Seu objetivo é apenas captar novos alunos? É um tipo de publicidade ou de comunicação diferente? É o site do processo seletivo? Foca apenas em potenciais estudantes ou também outras pessoas?” São várias as questões levantadas.

Eis o desafio de explicar marketing educacional durante uma ‘viagem’ de dez andares em um elevador, para alcançar uma definição concisa, sobre o que é o marketing e em como o exerço as atividades no mercado educacional ao longo dos anos.

 

O marketing, em amplitude e profundidade

Primeiro, sobre a amplitude, o marketing evoluiu ao longo das décadas, bem como sua definição – que muito se deve às produções do professor da Kellogg School of Management, Philip Kotler (que, para muitos, é o principal guru do marketing no mundo). Foi ele quem introduziu nessa técnica de gestão conceitos não apenas econômicos e voltados à geração de lucro, mas também psicológicos e sociológicos que trouxeram às reuniões executivas a ideia de que os negócios também deveriam valorizar as pessoas e seus desejos em seus planos estratégicos – e isso em 1968, na primeira edição do livro Administração de Marketing. Posteriormente, ainda propôs a necessidade de customizações em produtos e serviços, orientados aos conhecimentos sobre as naturezas funcionais e emocionais dos usuários. 

De publicação em publicação, Kotler redefiniu o novo marketing, focado não nas indústrias existentes, mas centrado no ser humano. As marcas passaram a agir como pessoas e passaram a ‘filosofar’ sobre um olhar voltado às demandas da sociedade de uma forma coletiva. Ao longo de seus mais de 90 anos de idade, antecipou o atual estreitamento das relações entre negócios e pessoas por meio da tecnologia e do mundo digital. Isso culminou no posicionamento das marcas como interlocutoras diplomáticas na relação inevitável de transparência necessária entre as empresas e as pessoas.

 

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Em sua abordagem mais recente, o marketing centrado em pessoas, ele convidou as lideranças e suas equipes a conhecerem mais o usuário ao quebrar o conceito de persona em pelo menos quatro grandes pilares: demográfico, psicográfico, comportamental e geográfico. Demonstrou a necessidade de se atuar com o gerenciamento de dados, predição, testes AB, otimizações etc. Kotler trata da amplitude, da essência e da filosofia de marketing, para qualquer que seja o tamanho, mercado ou segmento de organização existente, consolidada ou ainda emergente. 

A profundidade é mais fácil de explicar, pois se trata de especialização. Se as ferramentas e táticas de marketing são as mesmas, por que os profissionais precisam conhecer tanto sobre determinados mercados e segmentos para que obtenham os resultados necessários às suas metas? Não basta ser um profissional de marketing. Também é preciso que ele conheça sobre política, ou automóveis, ou supermercados e shoppings, ou bancos e mercados financeiros, ou saúde, educação. O profissional precisa ter conhecimentos de marketing orientados ao mercado e segmento em que ele atua. O cliente é o mesmo, mas ele não se comporta da mesma maneira ao adquirir um carro, escolher um filme, planejar uma viagem ou quando decide ingressar em uma IES para cursar uma determinada graduação, especialização ou programa de pós-graduação. 

 

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Os conceitos e usos do marketing precisam ser amplamente conhecidos pelos profissionais que se dedicam a essas áreas junto às suas empresas, empregadores e equipe. Mas, como os planos e as execuções das estratégias que atendem às necessidades das pessoas são especializadas, é importante que não apenas saibamos que os mercados não são iguais, mas que o marketing também precisa ser segmentado. Daí o marketing educacional, assim como o marketing político, o marketing de varejo, o marketing hospitalar e tantos outros complementos ao marketing quanto são as quantidades de mercados e segmentos especializados existentes.

Não existe receita de bolo ao se trabalhar com marketing. Todos os resultados positivos, necessários ao sucesso das organizações, dependerão de conhecimentos especializados. Um profissional de marketing poderá, eventualmente, mudar de mercado de atuação devido aos seus excelentes resultados em uma determinada indústria, mas para poder alcançar seus novos sucessos, será inevitável que ele se debruce e especialize-se em seu novo segmento de atuação.

 

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É importante ressaltar que, mesmo concordando com as publicações de Kotler, no atual contexto em que atuamos, para que sejamos bons profissionais de marketing, nossa amplitude de atuação precisa ir além da especialização em marketing. Devemos recorrer a outros métodos e teorias, de diferentes escolas, sejam elas das ciências exatas e da terra, social aplicada e, até mesmo, da biologia. Quanto melhor o repertório de conhecimentos adquiridos, maior será a visão sobre a complexidade dos desafios com o qual nos deparamos em nosso dia a dia. 

A título de exemplo, diariamente recorro à Teoria das Restrições, de Goldratt, inicialmente desenvolvida para a engenharia de produção; à Teoria da Difusão da Inovação, de Rogers; e as teorias da Inovação Disruptiva e do Trabalho a Ser Feito [Jobs to Be Done], ambas de Christensen. Também recorro à maiêutica e filosofia Socrática e às reflexões que gosto de fazer sobre os processos biológicos da homeostase em nosso corpo. Além de outras. 

 

O marketing educacional

Compreendo, portanto, que o Marketing Educacional é uma estratégia de gestão, executada por táticas e operações específicas ao segmento, destinadas a promover uma instituição de ensino, seus feitos e resultados, cuja natureza complexa é representada por um conjunto de fluxos e processos, convertidos e empacotados em serviços educacionais (em ensino, pesquisa e extensão) e seus impactos na sociedade. 

Essa abordagem visa entender e ajudar a atender as necessidades, o progresso desejado, os objetivos e as expectativas dos alunos e dos candidatos, das pessoas que fazem parte de seu grupo social, bem como de outras partes interessadas envolvidas no processo educacional (mantenedores, acionistas, alta gestão, academia e corpo técnico-administrativo), além, é claro, da sociedade, que é impactada pelos resultados, diretos e indiretos, gerados pelos serviços da instituição.

As metas do marketing educacional costumam se basear em um tripé: 1.criar, comunicar e entregar ofertas educacionais de valor que satisfaçam os alunos e candidatos; 2. alcançar objetivos estratégicos da instituição; ao mesmo tempo em que 3. criar significado para os colaboradores da instituição e para a sociedade. E elas possuem um certo grau de complexidade.

 

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A satisfação dos alunos e candidatos devem ser consideradas sob sua perspectiva, e não sob o ponto de vista da IES. Além disso, os objetivos da instituição nem sempre são conhecidos ou comunicados claramente para toda a organização. E a criação de significado também dependerá da cultura organizacional estabelecida. Contribuir para resolver essas questões faz parte do trabalho.

Diferentemente do marketing convencional, aquele de bens de consumo e varejo, que costuma focar mais no produto e suas características, o marketing educacional enfatiza a necessidade da criação de relacionamentos duradouros desde o primeiro contato, a promoção de experiências educacionais enriquecedoras e a gestão de uma marca com reputação sólida e de longo prazo para a instituição. É importante destacar que o marketing, seja educacional ou de qualquer outro segmento, comunica valor e vende algo cuja execução, uso e consumo da oferta não é de sua responsabilidade direta. O trabalho de entrega depende também de outros colaboradores responsáveis pela entrega, e o trabalho do aluno, de entrar no campus e na sala de aula ou de acessar o ambiente virtual de aprendizagem, não estão sob gestão do marketing. Envolver, desenvolver, criar significado, engajar e inspirar esses atores também faz parte do trabalho.

 

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Ainda sobre a complexidade de se focar no olhar no aluno e não na perspectiva da IES, uma descoberta que fiz ao longo dos anos é que, no marketing educacional, o consumidor do serviço, o aluno, apresenta duas naturezas, nem sempre compreendidas: aluno-cliente e aluno-estudante. Quando o aluno está se relacionando com o corpo docente da IES, seja em sala de aula ou em um laboratório de práticas, ele exerce sua natureza de estudante. Quando ele está na praça de alimentação, vai ao banheiro, ao estacionamento, ou mesmo no guichê de um setor de atendimento administrativo, este aluno está em sua natureza de cliente. 

Uma natureza não tem gerência sobre a outra. Na primeira, o estudante não deixa de fazer uma atividade acadêmica alegando que paga por um serviço e que por isso tem o direito de receber uma boa avaliação mesmo sem realizar tal atividade. Já na segunda, o cliente pode se recusar a frequentar um banheiro que não esteja devidamente limpo, alegando que paga por um serviço de qualidade. E quando ele está em um laboratório de práticas ou na quadra de esportes da IES? Depende da circunstância. Complexo? Talvez. Mas elucidar essa dupla natureza também faz parte do dia a dia como executivo de marketing educacional. A experiência pedagógica não é, necessariamente, meu trabalho. A experiência da vida no campus e em outros ambientes e canais digitais, é.

 

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Além disso, o foco no valor educativo e no impacto a longo prazo que a educação tem na vida das pessoas, em vez de apenas realçar benefícios imediatos ou características de uma oferta de curso. Destaco as questões éticas e de transparência envolvidas, devido à natureza da educação e seu impacto significativo na vida da pessoa humana. Incluo, também, considerações sobre os fatores anteriores ao ingresso ao ensino superior, que buscam compreender melhor a bagagem familiar, os atributos individuais e as experiências educacionais dos alunos e candidatos para personalizar as experiências referentes às ofertas educacionais e sua integração com tudo aquilo que fará parte de sua jornada junto à IES, de acordo com suas necessidades.

Isso quer dizer que o trabalho no marketing não se encerra quando o processo de captação de alunos é finalizado. Isso é apenas parte. É preciso atuar, de maneira transversal e em conjunto com outros setores da IES, na decisão deste aluno em permanecer ou persistir em sua jornada conosco.

 

Então, o que é marketing educacional?

A questão é o que se espera do marketing educacional. Você espera que ele influencie o design dos processos do serviço educacional que são prometidos na proposta de valor? Que melhore a experiência do aluno no campus e nos demais pontos de contato com a marca? Que o profissional de marketing considere o retorno sobre os investimentos e as questões de rentabilidade e margem de contribuição das ofertas educacionais? Se a resposta for sim, então esse marketing educacional possui um viés estratégico. Se a resposta for não, pode ser que o seu desejo seja um marketing educacional com outros vieses: o de captação e ações comerciais de conversão, ou ainda, o de comunicação institucional.

Não há o marketing educacional certo ou errado, mas existem aqueles que podem ser suficientes ou insuficientes, adequados ou inadequados, aos objetivos da IES. O essencial é definir claramente o progresso que sua IES deseja alcançar em determinada circunstância, para que o marketing tenha o direcionamento correto e possa atuar de forma eficaz e alinhada com os objetivos institucionais. 

 

Marketing é mais que ciência, é também uma arte

Síntese para os dez andares:

 

“O Marketing Educacional é a união da ciência e da arte de gerar valor autêntico para os alunos – ora clientes, ora estudantes. É a real intenção de contribuir para que os clientes internos e externos se tornem ainda melhores e que, por meio de uma abordagem holística e centrada no indivíduo, harmonize estratégias com os progressos, objetivos e experiências dos alunos ao longo de sua jornada educacional. 

Esse marketing educacional é especializado, integrado e transcende os métodos convencionais de comunicação, publicidade e promoção, utilizando análise de dados e criatividade para estabelecer conexões mais significativas e personalizadas.

O seu propósito é atrair, engajar e converter candidatos em alunos, promovendo um vínculo duradouro que vai além da sala de aula, incentivando sua ativa participação na comunidade. Isso é alcançado por meio do uso estratégico de dados para refinar campanhas, personalizar interações e aprimorar a experiência estudantil em todos os pontos de contato.

O marketing educacional integrado destaca-se na capacidade de adaptar-se às mudanças dinâmicas do setor educacional, enfatizando a importância do design de serviços, da sustentabilidade e do retorno sobre o investimento feito pela IES e pelo impacto de conscientizar e inspirar todas as partes interessadas. 

O Marketing Educacional é a arte de cultivar excelência, inovação e um impacto duradouro na vida dos alunos e na sociedade.”

 

Por: Glauson Mendes | 18/03/2024


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