NOTÍCIA

Edição 275

PUCPR vai implantar microflorestas na bacia do rio Belém

IES pública, privada, comunitária, confessional, com ou sem fins lucrativos, não importa, o envolvimento com as questões da sustentabilidade e ESG é a demanda do momento. Pensar em pesquisa, grade curricular, projetos de extensão e a administração propriamente a partir da Agenda 2030 do Pacto Global da ONU e seus 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável – os ODS – é um caminho inicial. O trabalho é gigante e toma corpo na IES a partir da convicção de que é possível realizá-lo.

Publicado em 18/05/2023

por Sandra Seabra Moreira

ESG, Microflorestas, PUCPR Plantio de mudas de árvores nas proximidades do rio Belém (Foto: LabClima PUCPR 2022)

A PUCPR elencou ESG na lista de suas áreas prioritárias, definidas em 2013. Nessas áreas, a instituição concentra esforços e recursos em operações no campus, na parte acadêmica e na pesquisa. Paula Trevilatto é pró-reitora de pesquisa, pós-graduação e inovação, atua nos programas institucionais de bolsas, de empreendedorismo, hotmilk e internacionalização. Ela participa da Rede 18, Sustentabilidade: ODS e ESG, do Semesp, espaço em que compartilha as boas práticas de ESG da PUCPR. 

Paula conta que ao filtrar a partir dos ODS as publicações de pesquisas científicas da PUCPR, de impacto internacional, descobriu um número crescente delas. E vêm aumentando a partir da ênfase que a instituição tem dado ao que chama de pesquisa aplicada à sociedade, aquela que busca resolver problemas reais, locais, alinhados à Agenda Global. “A pesquisa tem teor inédito, está na fronteira do conhecimento, por isso conseguimos publicar internacionalmente, mas tem impacto? Claro que produzir conhecimento inédito, inovador, é maravilhoso, mas que assunto está resolvendo? É uma agenda global ou é individual?”

 

Leia: ESG é esforço antigo de poucos com nova roupagem

 

Os pesquisadores aderem a esse estímulo. A busca por resolução de problemas faz crescer as linhas de pesquisas transversais, “porque as pessoas querem sentir a pesquisa aplicada”. “Pesquisadores de várias áreas atuam em projetos multidisciplinares para resolver problemas que têm relação com questões ambientais e sociais.” Na graduação, os estudantes tomam contato com disciplinas que tangenciam os ODS. “Essa é uma discussão na Rede 18. As universidades estão se organizando para ver a melhor maneira de fazer isso. Cada instituição trabalha esses conteúdos na própria matriz curricular, colocando nos 10% de extensão ou como disciplinas eletivas – que não são optativas, fazem parte, sim, da grade curricular, mas normalmente acabam sendo transversais.”

Uma única instituição não consegue abarcar todos os ODS. Uma inspiração para a PUCPR é o Times Higher Education e seus rankings que avaliam as IES de acordo com os ODS. A quarta edição do Impact Rankings, de 2022, incluiu 1.406 universidades de 106 países. Os indicadores utilizados nesses rankings auxiliam a elaborar ações. “Por exemplo, se trabalharmos o aumento de estudantes de primeira geração – aqueles que não têm pais nem avós que estudaram numa universidade – a instituição impacta positivamente no ODS 4, que trata da educação inclusiva.” 

Na administração do campus, a questão ambiental se impõe. “Há um plano diretor de infraestrutura neste momento. Inclusive, pode haver substituição de fornecedores e contratos. Por exemplo, há contratos que impedem a PUCPR de ter energias renováveis e limpas no campus. Estamos interrompendo ou revisando esses contratos, porque queremos energia limpa.”

 

O LabClima

 

O rio Belém passa ao lado do campus da PUCPR, em Curitiba. Na outra margem está a Vila Torres, com uma população que se dedica principalmente à economia da reciclagem – 70% dos habitantes da comunidade são catadores. A universidade tem relacionamento antigo com a comunidade. Atualmente, acontece o projeto LabClima, criado a partir de financiamento da União Europeia, por meio de edital de 2019 do programa Erasmus + e teve início em março de 2020.

O LabClima é a institucionalização no âmbito da PUCPR do Climate Labs, ação internacional que busca o fortalecimento das IES da América Latina para adaptação e mitigação dos efeitos das mudanças climáticas. Participam dele 13 universidades – três europeias e dez latino-americanas, sendo cinco colombianas, duas mexicanas e três brasileiras. A unidade da PUCPR tem como parceiros, além da comunidade da Vila Torres, o poder municipal e a FIEP – Federação das Indústrias do Estado do Paraná. “O LabClima não está direcionado para o desenvolvimento de tecnologias ‘duras’. Não vamos desenvolver conhecimento dedicado a construir um painel fotovoltaico mais eficiente. Uma das responsabilidades é implantar uma tecnologia social”, diz André Turbay, professor do curso de arquitetura e urbanismo com pesquisas na área de gestão urbana e coordenador do LabClima. Turbay utiliza o termo ‘socioambiental’. “Não costumo dissociar o social do ambiental”, explica. 

Criado o LabClima, outra orientação do edital de financiamento era obter um projeto piloto com uma comunidade local. A escolha pela Vila Torres se deu não só pela proximidade, mas porque a bacia hidrográfica do rio Belém é o local onde ocorre a maior incidência dos efeitos das mudanças climáticas – deslizamentos, inundações, erosões de margens do rio e ilhas de calor –, conforme descrito no plano de ação climática de Curitiba, publicado em 2020.

 

Dentro da comunidade

 

As primeiras conversas com representantes da comunidade começaram virtualmente, em meio à pandemia. Já havia relação da universidade com instituições que trabalham no território. Também havia críticas bem delineadas por parte da população local. Duas delas, conta o professor, é chegar à comunidade com ‘projetos prontos’ e pedir a adesão. A outra é o pesquisador ir ao território, fazer pesquisa e nunca mais voltar para contar o que aconteceu.

“A PUCPR é uma universidade muito grande, então existe naturalmente uma dificuldade institucional de horizontalizar os processos. Sabendo dessas críticas, estamos num esforço institucional – não só o LabClima –, para criar outro modelo de conexão entre as instituições”, diz Turbay. Ele já teve a oportunidade de trabalhar com os moradores da Vila Torres em projeto anterior. “Chamamos atores, autores e agentes da comunidade para conversar. Quando são apenas as pessoas conversando, acontece exatamente isso: pessoas trocando ideias sobre os problemas locais.” A inovação social, os processos criativos, diz Turbay, se dão por meio da comunhão dos conhecimentos – vividos, comunitários, acadêmicos – sem relação hierárquica.

 

SSIR Brasil: As diferenças entre ESG e investimento de impacto

 

A erosão das margens do rio Belém é um problema grave na Vila Torres. “Em cinco, dez anos, o impacto se torna significativo. Uma rua de seis metros hoje está com quatro”, conta o professor. No início, a demanda da população era a construção de um muro de arrimo. “Não é uma atribuição nossa. Mas é possível conectar o poder público e as outras hélices componentes do ecossistema, outras instâncias para fazer o alerta.” Outra questão é o estigma relacionado a essa população, considerada poluidora. E, nesse caso específico, diz Turbay, quem polui é a população de alta renda que vive onde o rio é encanado. 

Após reuniões consecutivas, a própria comunidade entendeu que o trabalho de alerta e informação acerca dos problemas ambientais do local deveria ser feito por meio de uma ação educativa. “Então respondemos: ok, isso a gente sabe fazer.” Também partiu dos moradores a ideia de guiar os pesquisadores pelo território, apontando os problemas, o que possibilitou a elaboração de uma cartografia social.

 

Educação socioambiental

 

“Minha última ação foi uma viagem de ônibus até o Parque Municipal Nascentes do Rio Belém, depois fomos ao Parque São Lourenço, para ensinar as crianças sobre onde nasce o rio. Passamos pelo centro e explicamos que lá o rio está por debaixo da cidade”, conta Paula Imperial, aluna do segundo ano do curso de Arquitetura e Urbanismo e voluntária no projeto do LabClima.

Paula menciona a importância da ação em sua vida acadêmica. “Acho interessante fazer parte, para ter uma ideia do impacto daquilo que estudamos na vida das pessoas. Ainda mais com crianças, que realmente falam o que pensam. Às vezes estudamos só matéria, e esquecemos do objetivo. Não é só fazer um projeto bonito, sempre tem o lado humano também.”

Mayara Bormann Azzulin entrou no doutorado no ano passado, no Programa de Pós-Graduação em Gestão Urbana, e integra a equipe de pesquisadores do LabClima. Sua pesquisa investiga a construção das metrópoles no Sul Global, e como as políticas de desenvolvimento e as questões climáticas são abordadas e acabam sendo absorvidas nesses territórios.

Especificamente na Vila Torres, Mayara participou de plantios de árvores, em ação que envolveu escolas e ONGs. Mas a principal atividade está na pesquisa que compara dados sobre inundações e alagamentos oferecidos pelos moradores com os dados fornecidos pela prefeitura municipal. “Os dados da prefeitura são gerados por meio de imagens de satélite e não têm acurácia muito grande”, explica. Essa pesquisa já contabiliza mais 1.600 entrevistas coletadas, a maior parte delas é de moradores da Vila Torres. “Percebemos que por mais que tenhamos esses dados super-técnicos, os moradores já têm uma noção e trazem dados precisos.”

 

Financiamento para microflorestas

 

Da própria comunidade veio a ideia da implantação de um roteiro de educação socioambiental. São microflorestas como ambientes pedagógicos, que também auxiliam na diminuição da emissão de carbono e ilhas de calor e aumentam a permeabilidade do solo. Mas, em setembro deste ano, o projeto Clima Labs termina. “E teremos de dizer como o LabClima se manterá.” Até agora, o LabClima conseguiu verba do CNPq para projeto de drenagem com soluções baseadas na natureza, com duração de três anos. Outra conquista foi o selo concedido pela Epic, instituição sediada em Nova York, que funciona como uma certificadora de projetos ambientais. É um seed money, um aporte para elaborar o projeto que pode, por exemplo, pagar um estudante bolsista. Além disso, “é uma certificação importante, que pode conectar o LabClima a outras agências financiadoras globais.”

 

Autor

Sandra Seabra Moreira


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