NOTÍCIA

Edição 273

Mudanças que melhoraram o negócio

Resistiu ao baque da pandemia quem rapidamente respondeu à demanda dos seus alunos. Ou quem percebeu que a metragem da estrutura física de uma IES já não diz muita coisa.

Publicado em 31/03/2023

por Sandra Seabra Moreira

CAPA 273 - Mudanças que melhoraram o negócio

Ao ensinar tecnologia e as bases da computação em 1.500 cursos livres, para dois milhões de estudantes, ao longo de três décadas, a tecnologia dará a resposta a esse esforço. Um avanço extraordinário permitiu períodos de quarentena, e o trabalho home office salvou vidas na pandemia. As facilidades foram tantas que poucos estão dispostos a abrir mão delas. A Faculdade Impacta, nascida desses cursos livres, em tempos de expansão física, até o ano passado num campus de 12 mil m2 na Barra Funda, inicia 2023 num prédio de pouco mais de 3 mil m2, próximo ao metrô Paraíso, na cidade de São Paulo. A pandemia foi um baque. Resistiu a ele quem rapidamente respondeu à demanda dos seus alunos. Ou quem percebeu que a metragem da estrutura física de uma IES já não diz muita coisa. A Faculdade Impacta é referência no ensino de tecnologia. Começou numa sala de um prédio na esquina da avenida Paulista, na capital paulista, com cursos de hardware para a formação de profissionais na área de suporte técnico. Cresceu na medida dos avanços tecnológicos, tomou 10 andares do prédio. “Cheguei a ter um giro anual de 300 mil alunos”, conta Célio Antunes, fundador e gestor.

Antes mesmo da pandemia, o EAD já anunciava a redução de estrutura física. Antunes desenvolveu cursos a distância e reduziu pela metade o número de salas, ficando com apenas cinco andares do prédio: “90% dos cursos eram presenciais, 10% EAD. Depois da pandemia, são 97% EAD e 3% presenciais. Entreguei mais salas em 2022, estou com apenas meio andar”, detalha. Os cursos livres contavam com 80 laboratórios, hoje são cinco. Mesmo nessas salas, os cursos são híbridos e têm alunos a distância. Logo no pós-pandemia, havia turmas com trinta alunos presenciais e dez a distância. Ao longo do curso, a porcentagem se inverteu.

Os cursos livres, entretanto, eram parte da estratégia de Antunes para alcançar o ensino superior. Com uma base de dois milhões de alunos, e o conhecimento acumulado em décadas no ensino de tecnologia, a Faculdade Impacta foi uma consequência. A ideia é que os profissionais que conquistam suas certificações por meio dos cursos livres sigam adiante na sua formação. “Hoje tenho muitos alunos dos cursos rápidos, de treinamento, que retornam para a graduação, ou para um MBA.”

 

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Verticalizada em tecnologia, o ecossistema da faculdade oferece 200 cursos livres EAD gravados, outros 250 online ao vivo, oito bootcamps, sete tecnólogos, 20 graduações em tecnologia, sendo oito delas EAD e 15 MBAs. Num mercado em que a evasão nos cursos EAD costuma atingir 40%, a Impacta está em 12%. Para Antunes, a diferença é a qualidade dos cursos, que são produzidos pela própria faculdade. “A criação de um curso EAD pode custar 2 milhões de reais. São muitas horas de trabalho de professor-doutor gravando aulas, contratado pela CLT. Há o estúdio, o editor de vídeo, o profissional que faz captura, o conteudista, o roteirista. É uma conta que não é fácil, porque baixou o ticket médio, o investimento é alto e precisa de volume. É a qualidade que garante esse volume. Pouca evasão, investimento rentabilizado.”

Na graduação, 80% dos alunos frequentam cursos EAD. Os outros 20% se deslocam até o prédio três noites ou três manhãs por semana. O nicho de tecnologia em que a Impacta atua facilitou, obviamente, a transição e a adaptação. A preocupação com a capacitação dos professores, capítulo difícil para muitas IES, não tem a mesma dimensão, já que a maioria deles sempre esteve envolvida com a tecnologia. Entre os alunos, a maioria prefere assistir às aulas de casa. Jovens entre 17 e 20 anos ainda requerem a vivência do campus.

“Hoje o estudante vai para a faculdade para fazer coisas complexas, um projeto, um protótipo, construir um braço robótico, desenvolver um software com o professor, pensar na sua start-up. O que realmente acabou na Faculdade Impacta foram as cadeiras universitárias, de bracinho, com o aluno passivo, ouvindo o professor falar. Isso acabou. Tenho cinco mil cadeiras universitárias à venda”, finaliza Antunes.

 

Ambiente virtual de negócios

 

Faz todo o sentido uma faculdade de tecnologia oferecer ensino virtual. Mas a afirmação não é válida apenas para esse nicho. “Em se tratando de uma escola de negócios, que lida com um público executivo, obviamente da área de humanas, o ensino virtual faz todo o sentido”, diz Fernando Trevisan, diretor administrativo da Escola Trevisan de Negócios. Em 2021, a escola fechou seus 3 mil m2, um prédio exclusivo que recebera investimentos como a construção de um auditório, e se transformou em 100% digital. Antes da pandemia, a instituição caminhou em direção ao EAD, o que facilitou a transição. À época, os alunos gostaram do digital. E continuaram gostando. “Tivemos uma aceitação muito boa do nosso público, ampliamos a escala, passamos a atender além das fronteiras físicas anteriores, inclusive brasileiros que moram fora. Alguns preconceitos em relação ao ensino virtual que o mercado tinha foram superados, ao mesmo tempo que as tecnologias avançaram de forma muito acelerada, contribuindo para encontrar melhores soluções para o processo de ensino-aprendizagem”, conta Trevisan.

Nos últimos dois anos, mais que dobrou o número de alunos, hoje chegando aos seis mil. “O ticket médio caiu um pouco, que é da natureza do modelo digital, mas isso foi mais do que compensado pelo crescimento no número de alunos. Nossa receita aumentou mais do que 50 por cento nesse período.”

Os 80 profissionais envolvidos no dia a dia da escola utilizam, em esquema de rodízio, uma sala alugada em escritório compartilhado em São Paulo, com capacidade para 12 lugares. Até mesmo esse espaço seria dispensável para operar, diz Trevisan. Como filosofia de gestão, ele entende ser importante uma base para o administrativo, para encontros, discussões, brainstorming. “Tem funcionado bem. Todas as empresas estão nesse processo de entender até que ponto vai o trabalho híbrido, o que funciona melhor, se a distância ou presencial. Hoje nem entenderíamos um modelo de trabalho que exigisse a presença física todos os dias da semana, não tem mais necessidade.”

 

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A Escola Trevisan de Negócios oferece dois cursos de graduação e mais de 20 MBAs. Há formato de conteúdos gravados, convergindo mídias, há cursos com aulas ao vivo e há os que misturam os dois formatos. “O caminho vai ser cada vez mais essa mistura de momentos ao vivo e assíncronos, em que a pessoa pode escolher o horário.”

O trabalho de capacitação dos professores objetivou o uso mais aprofundado das tecnologias. “Antes usávamos de forma mais básica; a partir do momento em que se é forçado a viver de forma 100% digital, é preciso encontrar mecanismos que vão além da mera transposição de uma sala de aula física para uma sala virtual. E fomos descobrindo a amplitude que as tecnologias oferecem.” Trevisan exemplifica com a possibilidade de se relacionar com mais pessoas, sobretudo para os alunos dos cursos MBA. “O networking ficava restrito a quatro paredes e hoje percebemos que existe um potencial muito grande de ampliá-lo se bem utilizadas as tecnologias digitais.”

A capacitação de professores é um dos aspectos importantes para o salto de qualidade no EAD. Há outros, claro, como acompanhar as tendências tecnológicas, sempre no sentido de aprimorar a experiência do aluno no mundo digital, até porque modelos atrativos garantem a permanência dos alunos. Assim como o sentimento de fazer parte da instituição, “um ponto importante, mesmo que o curso seja no formato de aulas assíncronas”.

 

Susto até no que já era digital

 

A Faculdade Descomplica nasceu como faculdade digital, quinze dias antes de decretada oficialmente a pandemia no país. Isso significa conjunção favorável? Não exatamente. O que era o diferencial da faculdade tornou-se uma necessidade. “Tivemos que antecipar algumas ações”, fala Francisco Borges, vice-presidente de regulação.

O primeiro processo seletivo aconteceu para o preenchimento de 300 vagas em cada um dos quatro cursos oferecidos: licenciatura em pedagogia, tecnólogo em RH, e dois bacharelados, em administração e ciências contábeis. “São cursos que estão entre os dez cursos EAD mais procurados no Brasil”, menciona Borges. Em maio, todas as vagas de todos os cursos foram preenchidas. O semestre começaria em agosto. Foi esse hiato de três meses, em plena quarentena, com estudantes ávidos por preencher horas de folga com estudo, que demandou uma ação rápida. “Antecipamos a entrada dos alunos, com reforço pedagógico a partir de conteúdos relacionados aos cursos. O nivelamento que se propõe aos alunos foi oferecido como antecipação”, conta Borges.

 

Na contramão

 

A Escola de Negócios e Seguros foi até 2016 uma instituição focada no ensino técnico, para a formação de corretores de seguros. Tornou-se faculdade. Tem cerca de 1.280 alunos no ensino superior e oferece sete cursos, entre os de curta
duração, tecnólogos e imersões internacionais. Com nicho tão bem estabelecido desde a fundação, poderia seguir o mesmo rumo de instituições similares. Nesse momento, entretanto, busca a expansão e não abrirá mão do presencial.

Evellyn Franco é pedagoga, especialista em educação a distância e gerente da ENS. “A escola quer atuar nos três segmentos, presencial, híbrido e ensino a distância. O pensamento é que o ensino não tem paredes, mas interações presenciais são importantes.” O perfil de aluno da ENS é de profissionais que já trabalham. Os estudantes de cursos técnicos estão mais focados nos cursos a distância. “Muitos não se adaptaram ao ensino digital e a ENS quer atendê-los”, afirma Evellyn, e propõe reflexões. “Temos visto no mercado números muito altos de evasão no digital, ao mesmo tempo que o presencial foi perdendo a força. Entendo essas questões como uma necessidade para se pensar no propósito e não na forma. A questão principal é: o que ele está fazendo no digital? Quais experiências de fato trazem aprendizagem significativa no digital e o que importa para o estudante no presencial?

A estrutura da ENS é de nove andares em prédio na esquina das ruas Augusta e Paulista, em São Paulo. Enquanto torna o currículo cada vez mais contemporâneo e focado nas necessidades dos alunos, a ENS investiu numa sala multimídia, a Sala do Futuro, onde o melhor dos dois universos – digital e presencial – pode acontecer. Com estrutura de teleconferência, é possível mesclar estudantes que querem estar no presencial e os que estão a distância, com professores internacionais ou de outros estados, realizando interações nos dois formatos.

 

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E veio a crise. Pouco mais de um mês de funcionamento, o AVA quebrou por causa do acesso excessivo. “Porque não esperávamos tanta demanda, e o problema não era de programação, era de infraestrutura. Fomos transparentes. Limitamos acessos a disciplinas e em dez dias resolvemos o problema definitivamente. Antecipamos o investimento da infraestrutura.”

Já os alunos gostaram das aulas antecipadas. Tiveram tempo para a ambientação na plataforma digital. O encantamento, diz Borges, veio por causa das trilhas de aprendizado que oferecem as mídias de preferência de cada aluno, personalizando o aprendizado. São uma espécie de atração principal dos cursos virtuais. “Criamos uma trilha formativa muito diversa e com várias mídias. E há avaliação a cada aula. Também temos questões abertas, discursivas. O material tem reactions. Para cada vídeo, por exemplo, o aluno opta por cinco reações, desde ‘socorro’ até ‘tô adorando’”, detalha Borges. Quanto mais vídeos o estudante assiste, mais vídeos recebe. O mesmo para textos, se for o caso de gostar de ler – o que é raro.

Atualmente, a Faculdade Descomplica oferece 14 cursos nas áreas de negócios modernos e tecnologia. Acerca do fato de não permitir uma vivência plena, por causa da total digitalização, Borges pondera que uma IES não cobre todas as necessidades sociais. É preciso foco. “Pelo momento atual, o meu aluno não quer um diploma, quer a carteira de trabalho, um contrato de serviços. O estudante da área de negócios, às vezes, está estudando para mudar de carreira. Na área de TI, descobrimos que há alunos que pagam o curso para usar as ferramentas que ele disponibiliza. Ou seja, aproximamos o estudante do mercado de trabalho.”

Autor

Sandra Seabra Moreira


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