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Entrevista

Educação em regresso

Em entrevista, Rodrigo Capelato, diretor-executivo do Semesp traça um panorama crítico e realista da educação brasileira, onde os resultados são desoladores e a conta será caríssima pela falta de capital humano

Publicado em 27/09/2021

por Mayara Figueiredo

educação brasil Hoje só 2,2% dos estudantes ingressam com o Fies, mas com o crédito próprio das instituições já são 5,5%, ou seja, é mais do que o dobro de quem entra com o financiamento público (foto: Envato Elements)

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Hoje só 2,2% dos estudantes ingressam com o Fies, mas com o crédito próprio das instituições já são 5,5%, ou seja, é mais do que o dobro de quem entra com o financiamento público (foto: Envato Elements)

Como está a avaliação das instituições de ensino superior quanto ao preparo e nível de aprendizagem dos alunos que chegam do médio?

As IES vêm sofrendo com essa questão já há algum tempo. Grande parte dos alunos, especialmente os oriundos das escolas públicas, já chegavam com muitas defasagens, principalmente em português – leitura, interpretação e escrita, e também em matemática. São muitos problemas de base, o que atrapalha muito o desenvolvimento nos cursos superiores, tanto é que, a evasão é muito grande já nos primeiros meses, quando eles percebem que não conseguem acompanhar os estudos, sobretudo em cursos que demandam cálculos e física, como é o caso das engenharias.

Leia: Ensino superior para quem o desejar

As instituições passaram então a elaborar programas de nivelamento e uma série de coisas para tentar atenuar essa situação, mas a gente sabe que elas não resolvem, afinal, trata-se de um problema de mais de oito anos de estudo entre o fundamental e médio. E com a pandemia vemos que esse problema se agravou e começa a nos preocupar sobre o que virá a ser a partir do ano que vem. Temos observado que o aluno do ensino médio público ficou sem aula todo esse período. Apesar do governo falar em aulas online, isso não estava acontecendo, muitos mal conseguiram acompanhar. Se no presencial eles já têm uma dificuldade muito grande de acompanhamento por causa da estrutura familiar mais vulnerável, que não apoia tanto os estudos – além dos próprios problemas da escola pública quanto à valorização de professores e da qualidade de ensino em si – quando esse aluno parte para o totalmente online, a defasagem aumenta ainda mais. Então esse período não só o paralisou, como o fez regredir três, quatro anos de estudo. Logo, essa é uma situação bastante preocupante e desafiadora para o setor.

Os estudantes ainda podem encontrar no ensino superior melhores chances de ascensão social e ingresso ao mercado de trabalho ou como defende o ministro, o ensino técnico é uma opção mais rápida e eficaz?

Aí é que está o grande equívoco, ele coloca a situação como sendo uma excludente da outra. O médio técnico que o ministro defende é fundamental, porque claro, não é todo mundo que vai ingressar no ensino superior, só que no Brasil a questão é que pouquíssimas pessoas estão nesse nível. Se desse para todos estarem, muito melhor, é ideal para qualquer país do mundo que sua população tenha tido acesso ao ensino superior, ter altos níveis de capacitação. Mas falar que existem poucos técnicos porque tem muita gente no ensino superior, isso não existe. Na verdade temos poucas pessoas no ensino técnico, poucas pessoas no ensino superior, é preciso avançar em todos os níveis, como falei, temos apenas 18% de jovens no ensino superior, na Argentina são 30%, no Chile 40% nos EUA e países da OCDE, a média é 43% e aqui, estamos falando de apenas 18%. É muito abaixo do razoável. Novamente, é preciso pulverizar as formações para outras áreas também, além de a maioria estar concentrada nos bacharelados, são nos mesmos cursos: direito, administração, etc. É preciso incentivar a formação em áreas que estão gerando demanda e maior oportunidade de empregabilidade.

E como ficam as expectativas do setor para este cenário?

Infelizmente o que a gente vê é falta de política pública e divisões como “eu não concordo com a iniciativa privada e apoio a ampliação pelas universidades públicas” ou “eu concordo e quero só instituições de tipos diferentes, etc.”, mas o importante é que existam políticas de inclusão e manutenção da expansão do setor. Hoje a gente não tem nenhuma política então vemos que vamos voltar a ser mais excludente, cada vez mais afastando o jovem do ensino superior e essa conta virá lá na frente, repetindo o que já passamos uma vez: apagão de mão-de-obra. Quando a economia começar a crescer novamente, vamos precisar de profissionais qualificados para certas áreas e não vamos ter. Vamos esbarrar novamente na falta de capital humano, nas áreas de tecnologia principalmente. Vai ter apagão, essa conta vai chegar. Estamos sem perspectivas. As escolas e instituições de ensino superior vão continuar, elas têm essa capacidade muito forte de sobrevivência e de se reinventar, mas do ponto de vista de acesso, não vejo perspectiva no curto prazo.

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Autor

Mayara Figueiredo


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