Já na Inglaterra, prevê-se perda de 6 bilhões de libras na economia
Publicado em 31/05/2020
No mundo inteiro, milhões de estudantes universitários tiveram suas rotinas alteradas, cursos cancelados ou transformados em plataformas EAD ou videoconferências – às vezes com professores e mesmo colegas que nunca viram pessoalmente.
Alguns desses estudantes estavam no seu primeiro ano, e um início de curso atribulado pode ser bastante desestimulante. Outros, no último ano, estão apreensivos com relação às provas finais e mesmo frustrados com a perspectiva de não realizar tão cedo a esperada colação de grau.
Leia: Com a pandemia, 30% das instituições de ensino podem fechar as portas até o fim do ano
Do ponto de vista dos professores universitários e das instituições de ensino, o cenário não é tampouco mais tranquilo. Se de um lado os professores procuram inovar suas estratégias para garantir o ensino a distância, diversas universidades temem a evasão dos estudantes e se desdobram para dar continuidade ao ensino em um mundo que parou.
Nos Estados Unidos, por exemplo, um artigo do The New York Times[1] traz notícias nada agradáveis do mundo de lá. “Não é uma questão de se as instituições [de ensino] vão ser forçadas a fechar permanentemente, a questão é de quantas serão.” A preocupação advém do fato de que a maior parte das instituições de ensino superior obtém sua receita duas vezes ao ano, nas matrículas de cada semestre. Como as previsões são de diminuição das inscrições para o próximo semestre que começa em setembro – e com perspectiva de que as opções de cursos on-line possam apenas parcialmente substituir os cursos presenciais – muitas universidades temem pela sua capacidade de manutenção financeira.
Em resposta a essa crise enfrentada pelas universidades, faculdades e escolas de comércio norte-americanas, o governo federal criou um Fundo de Ajuda Emergencial do Ensino Superior (Higher Education Emergency Relief Fund). Cerca de 5.000 instituições estão aptas para receber o montante do Fundo que soma 14 bilhões de dólares.
Algumas das universidades mais ricas do país, como Harvard, Princeton e Stanford, declararam que não vão acessar o fundo. No meio da discussão, houve inclusive troca de declarações públicas um tanto ásperas entre o presidente dos EUA, Donald Trump, e a comunicação oficial de Harvard[2].
A situação não é melhor no Reino Unido. Em uma análise feita pela London Economics a pedido do Sindicato do Ensino Superior Britânico (University and College Union) sugere que cerca de 230.000 estudantes devem deixar de entrar no sistema de ensino superior em 2020, sendo a metade de estrangeiros.
Na reportagem do The Guardian[3] que explora essa pesquisa e o impacto da Covid-19 na educação superior, a estimativa é que sem um apoio do Estado britânico, as perdas para a economia devem ultrapassar os 6 bilhões de libras esterlinas.
Parte das instituições de ensino tem preparado planos de contingência para adaptar seus cursos para a modalidade a distância, no caso de que uma nova onda de contágios comece durante o inverno, e, portanto, no meio do próximo período letivo (setembro-fevereiro).
Muitas das universidades estão propondo que o primeiro ano dos novos estudantes seja feito completamente on-line – uma forma de evitar um número menor de matrículas frente a um cenário futuro ainda incerto. Contudo, especialistas ouvidos pelo principal jornal britânico[4] advertem que a maior parte dos estudantes do primeiro ano universitário são jovens que não estarão motivados ou mesmo preparados para lidar com um primeiro ano que exija esse nível de autonomia.
Outras dúvidas também pairam sobre estudantes e instituições de ensino francesas. Uma reportagem especial feita pelo jornal 20 minutes tenta trazer algumas respostas com relação aos principais exames nacionais[5].
Um Comitê de Direção Operacional foi estabelecido pelo governo francês para revisar o formato e data de todos os exames para ingresso nas faculdades bem como para os concursos para evitar que os estudantes sejam penalizados. De toda forma, nenhuma prova será realizada antes do fim de maio.
Uma das maiores preocupações concernentes ao ensino superior é a prova do fim do ensino médio francês, chamada popularmente de bac (do francês baccalauréat), a qual é necessária para ingresso em universidades, faculdades e escolas de comércio. Como as datas e formato exato da saída do confinamento ainda são desconhecidos, a prova foi anulada, e a nota dos estudantes será a média dos seus trimestres do último ano – mas apenas dos trimestres cursados presencialmente.
Por outro lado, algumas Escolas de Negócio espanholas já vinham colocando em prática nos últimos anos cursos totalmente on-line e afirmam que a experiência anterior permitiu uma adaptação favorável em um mundo em confinamento.
Procuradas não apenas por estudantes espanhóis, mas sobretudo por estrangeiros que não têm possibilidade de deixar seus países devido a restrições de trabalho, por exemplo, muitos cursos como MBAs espanhóis têm aumentado seu reconhecimento internacional, ocupando os primeiros lugares de rankings internacionais, conforme mostra reportagem do El País[6].
Em uma outra notícia do jornal espanhol, o maior do país, em diversas dessas Escolas de Negócios, não foi nem mesmo notada uma diminuição significativa no acesso e acompanhamento dos cursos on-line por parte dos estudantes, que seguem normalmente sua formação[7] – ainda que dadas as circunstâncias excepcionais podem ser prorrogados prazos de entrega de trabalhos e outras tarefas.
Efetivamente, este não é o caso de uma dezena de outros cursos nos quais a presença é essencial para aprendizagem. Como um contraponto à defesa generalizada da aprendizagem on-line, uma outra reportagem[8] espanhola lista as dificuldades dos principais cursos afetados pela pandemia, caso de áreas ligadas à saúde, biologia, educação e prática esportiva – para citar alguns exemplos.
Desafio maior para uns do que para outros, como forma de apoiar os professores, a Associação de Reitores e o Ministério das Universidades Espanhol lançou em março uma plataforma chamada “Conect@ados: a Universidade em casa, para ajudar os professores em sua mudança precipitada à docência virtual”[9].
As medidas para lidar com a crise têm sido diferentes em cada lugar. A Universidade de Buenos Aires (UBA), que conta com maior número de estudantes matriculados na Argentina, declarou no começo
do mês que o retorno às aulas se daria apenas no dia 1º de junho e que es-
tenderia o ano escolar até março de 2021.
Aparentemente essa decisão decorre também da reivindicação dos sindicatos de professores que afirmam que a educação a distância não está contemplada no acordo de sua atividade[10].
Apesar da medida adotada pela UBA, a maior parte das instituições de ensino dos nossos vizinhos argentinos tem mantido o calendário escolar inalterado, com o prosseguimento dos cursos por meios virtuais, pelo menos até o fim de maio.
Em um momento em que sobram incertezas de como daremos continuidade na vida cotidiana no mundo todo, a vida universitária também carece de respostas duradouras e definitivas. Felizmente, o ensino superior é responsável, em sua origem, por fazer as perguntas certas, mesmo antes de encontrar as respostas.
2 https://www.nytimes.com/2020/04/22/us/harvard-trump-coronavirus.html?searchResultPosition=5
6 https://elpais.com/elpais/2020/04/20/actualidad/1587378106_544979.html
7 https://elpais.com/elpais/2020/04/20/actualidad/1587371311_958869.html