NOTÍCIA
Disciplina passou da prática da ginástica voltada para a melhoria de uma geração a novo status dentro do currículo escolar
Publicado em 08/07/2015
Homens novos, mais fortes e melhores, os ideais da revista Educação Physica, dos anos 30 |
“Mens sana in corpore sano“, diz o famoso ditado em latim para ilustrar a importância de um corpo “são” como parte fundamental de um indivíduo completo. Essa é uma das bases para o desenvolvimento da noção de uma educação física ao longo da história. Tanto na Antiguidade oriental (China e Índia) quanto na ocidental (Grécia e Roma), exercícios para o corpo partiam de princípios bélicos e motivações terapêuticas, assim como ideais de beleza, lazer e mesmo religiosos. A preocupação com o corpo perde força durante a Idade Média (a nudez e o culto ao belo eram, grosso modo, associados ao pecado), mas retoma sua importância na sociedade ocidental com a Renascença e as relações entre arte e anatomia – basta lembrar do Homem Vitruviano de Leonardo da Vinci. As primeiras aulas envolvendo exercícios físicos dentro de um currículo escolar regular também datam do período.
A educação física que se desenvolve no século 19 e chega ao Brasil é, por sua vez, fortemente baseada em princípios higiênicos e eugenistas, herança da ginástica alemã. A “pedra fundamental” da educação física escolar no país talvez seja um parecer de Rui Barbosa de 1882 sobre a chamada lei da Instrução Pública. O célebre jurista defende a prática da então chamada “ginástica” em todas as escolas e eleva o status dos professores da área, colocando-os em igualdade com os das demais disciplinas. Durante a década de 1930, uma das principais fontes de estudo sobre o tema no Brasil era a revista Educação Physica, que circulou entre 1932 e 1945 e procurava transmitir ideais dos movimentos europeus de “aperfeiçoamento da raça” – um tema amplamente discutido entre a intelectualidadade da época. Na dissertação de mestrado “A revista Educação Physica e a eugenia no Brasil (1932-1945)”, de autoria de Tarciso Alex Camargo, defendida em 2010 na Universidade de Santa Cruz do Sul (Unisc), um trecho destacado pelo pesquisador deixa claras as intenções da publicação:
“Homens novos, homens mais fortes, homens melhores vão surgir”.
É nesse contexto que surge o primeiro curso de educação física no Brasil, na Escola de Educação Física do Estado de São Paulo, que iniciou sua primeira turma em 1934. Pouco mais de uma década depois, com o fim da Segunda Guerra, a derrocada dos ideais de “homem novo” do nazismo e o fim da Era Vargas, os caminhos da educação física no Brasil voltaram-se para outras discussões, como o aperfeiçoamento pedagógico do professor, e os esportes começaram a crescer em importância no currículo. Na esteira da ditadura militar estabelecida a partir de 1964, a ideia de fortalecimento da nação por meio das atividades esportivas e da competição dominou a educação física escolar. A partir de 1969, a legislação passou a restringir a formação de professores da área ao curso de educação física – o bacharelado foi criado em 1987.
No entanto, a abordagem contemporânea da disciplina, voltada à formação integral do indivíduo e valendo-se das ciências humanas, só toma força no final da década de 1990, em meio a uma compreensão de desenvolvimento mais amplo do aluno e da elevação do status pedagógico da educação física no currículo escolar.