NOTÍCIA
Gestão do ensino deve acompanhar as mudanças sociais, tecnológicas e políticas, diz Paulo Cunha, do Grupo Positivo
Publicado em 22/08/2013
A gestão nas instituições de ensino deve acompanhar as mudanças sociais, tecnológicas e políticas que impactam o sistema de educação como um todo, diz o superintendente de ensino do grupo Positivo
por Udo Simons
“O Brasil precisa formar mais gestores em educação.” A afirmação contextualiza o cenário educacional brasileiro vivido nos dias de hoje na opinião do superintendente de Ensino do Grupo Positivo, Paulo Cunha. “O grande problema está menos dentro de sala de aula, e sim no sistema de gestão das escolas. Esse é o grande ponto”, sugere.
Em agosto, o Instituto Positivo, braço de responsabilidade social do grupo, organizou pelo segundo ano consecutivo o Sala Mundo, evento voltado a gestores educacionais e educadores, ocorrido em Curitiba (PR). Neste ano, o tema central do encontro foi O mundo da sala de aula e reuniu, entre outros, o ministro da Educação, Aloizio Mercadante; o especialista em educação e autor do best-seller How Children Succeed, Paul Tough; e o antropólogo e professor do Instituto de Estudos Brasileiros de Cambridge, James Ito Adles.
Nesta entrevista à revista Ensino Superior, Paulo apresenta esse mundo que se vive dentro da sala de aula e que foi tema do evento. “Veremos uma escola totalmente diferente nos próximos anos”, acredita. Para ele, muitas das mudanças, já adotadas ou prestes a acontecer, virão na esteira dos avanços tecnológicos. Nesse sentido, Paulo prevê que as mudanças na metodologia de ensino já estão em curso, embora nenhum país ainda tenha conseguido definir uma forma única de ensinar. “Estamos chegando, praticamente, à individualização do ensino, havendo uma maneira diferente para cada pessoa.”
Ensino Superior: Um dos objetivos do evento Sala Mundo foi o de olhar para os desafios vividos, atualmente, pela educação no Brasil. Que desafios são esses?
Paulo Cunha: Temos um problema de quantidade de alunos no ensino superior brasileiro. Atingimos um número de pessoas menor do que deveríamos. Conforme nossos indicadores, atingimos entre 13% e 15% da quantidade de alunos que deveriam estar no ensino superior [em relação à população do país, na faixa etária de cursos de graduação]. Os alunos que terminam o ensino médio não chegam ao ensino do terceiro grau.
Por que estudantes do ensino médio não alcançam o ensino superior?
Pela questão social. O ensino médio é fora do contexto do mercado de trabalho. O aluno demora muito para completá-lo. Isso faz com que ele, quando finalmente consegue terminar o ensino médio, queira trabalhar. Então ele prioriza o ganho ao invés dos estudos. Um dos grandes problemas do ensino superior está no ensino médio.
Como o ensino superior pode atrair mais alunos?
Precisamos ir além do marketing. Temos de trabalhar de forma mais profunda. Um exemplo é o programa de estímulo ao ensino técnico. O governo está sinalizando para que instituições de ensino superior deem uma mão na formação técnica. Temos condições para fazer o aluno obter uma profissão de forma mais rápida.
O que o senhor quer dizer com “dar uma mão”?
Dar uma mão no sentido de talvez criar, como foi criado no terceiro grau, uma forma de financiamento para o aluno fazer o ensino médio e técnico. Precisamos ter um Fies para os ensinos médio e técnico. Isso é algo sinalizado pelo governo, mas ainda falta ser operacionalizado.
O que a Universidade Positivo faz nesse sentido?
Estamos planejando para meados de 2014 a abertura de cursos técnicos em enfermagem, engenharias eletrônica e industrial, manutenção.
A iniciativa da abertura de mais cursos técnicos seria suficiente para resolver a situação de baixa formação no ensino médio?
Não, isso é pouco. As universidades podem ajudar, mas não vão sozinhas resolver o problema. Isso depende da política de governo em alterar o ensino médio. A universidade pode simplesmente contribuir. Criar oportunidade para pessoas de baixa renda obterem maior capacitação. Isso é uma contribuição.
Além de financiamento, que outra solução pode ser adotada?
Podemos colaborar na capacitação dos professores nas licenciaturas e cursos de pós-graduação, na área de educação e gestão da educação, para fazer um ensino médio mais voltado à formação do mercado de trabalho. Consequentemente, o aluno passa a ter mais vontade [de estudar] e consegue entender por que está fazendo o ensino médio; e, assim, consiga chegar ao terceiro grau.
O Grupo Positivo tem essa postura de incentivo ao aluno. Como vocês fazem isso?
Testamos novas tecnologias nas escolas para que consigamos ter cada vez mais um ensino médio voltado para o aluno ter prazer em estudar e entender por que ele deve cursá-lo.
O tema central do Sala Mundo foi O mundo da sala de aula. Que mundo é esse em 2013?
Nos próximos anos veremos uma escola totalmente diferente. O professor passa a ser um intermediador do conhecimento, não mais o dono. Isso será salutar, mas só será possível com o uso da tecnologia. Temos de universalizar o uso da tecnologia nas nossas escolas. A tecnologia hoje está em toda a sociedade e a cada dia fica mais barata.
O professor do ensino superior está preparado para essas mudanças?
Depende. De forma geral, diria que não. Mas muitos já entendem essa nova forma de ensinar.
A partir dessas mudanças, qual metodologia deverá permanecer em sala de aula?
Não há uma uniformização na nova forma de ensinar. Ainda não se chegou a uma conclusão de qual seria a melhor metodologia a ser adotada em sala de aula ou como fazer isso. Penso que cada uma das novas formas de ensinar é um progresso. Aos poucos uma nova metodologia surge. Talvez não seja mais única como no passado, um professor em frente a um quadro-negro. Há espaço para que em uma mesma sala de aula sejam aplicadas várias metodologias. Ou seja, talvez tenhamos uma metodologia adequada para cada situação. Talvez isso seja justamente o melhor de tudo.
Essas novas metodologias estariam relacionadas também ao fim da horizontalidade de relações sociais, quando hierarquias inexistem, como no caso das manifestações de ruas que aconteceram por todo o país nos últimos meses? Como o senhor observa isso?
Essa situação ainda é incipiente, mas é por aí o caminho. Você passa a individualizar a prática do ensino. E isso, na verdade, é o que me parece que a população está demonstrando. Chega ao ponto de que não precisa de mais representantes, ela se representa individualmente. O ensino está chegando a algo que vai ser parecido com isso, praticamente, a individualização do ensino para cada pessoa.
Os gestores das instituições de ensino superior estão preparados para essas modificações?
Não. Eles não estão preparados. O Brasil precisa, hoje, formar gestores em educação. O grande problema é que nossas escolas se preocupam muito pouco com a gestão. Em qualquer curso de licenciatura, o número de disciplinas de gestão é muito, muito pequeno. Temos um atraso nesse sentido.
O que é na prática esse atraso mencionado pelo senhor?
Na forma como se gasta o dinheiro, na forma como se aplica esse dinheiro em equipamentos, como se chega ao aluno, o que se passa para ele. Estamos com problemas de gestão na educação em todos os níveis e por todo o Brasil. Por muito tempo estudou-se como resolver a questão do aprendizado, da técnica para se passar para o aluno, mas hoje o grande problema é a gestão das escolas. Atualmente, o grande problema está menos dentro de sala de aula. Está, sim, no sistema de gestão das escolas. Esse é o grande ponto.