Com o fim da possibilidade oferecida pelo MEC os cursos de especialização em instituições não educacionais são ofertados de diferentes maneiras
Publicado em 13/03/2013
Com o fim do credenciamento especial do MEC os cursos de especialização em instituições não educacionais são ofertados de diferentes maneiras, que ainda estão longe de ter um consenso
por Rodolfo C. Bonventti
Passado um ano e meio do fim do credenciamento especial de instituições não educacionais para a oferta de pós-graduação lato sensu (especialização ou MBA), a determinação do Ministério da Educação de não chancelar os diplomas desses cursos ainda causa polêmica. Para se adequar à medida, as instituições partem para alternativas distintas que vão da ação judicial à criação de faculdades próprias ou parcerias com outras instituições. Mas seja qual for a ação escolhida, especialistas recomendam cautela.
O credenciamento especial existia há 10 anos, e 123 diferentes organizações como escolas de negócios, conselhos de classe profissionais e hospitais que possuíam esse credenciamento foram atingidos pela medida, o que segundo levantamento do Conselho Nacional de Educação (CNE) representa pouco mais de 5% do total de instituições regulares de ensino superior no Brasil. Uma primeira e única flexibilização do parecer, até aqui, veio um pouco depois do cancelamento oficial, quando o MEC liberou essas pós-graduações desde que essas mesmas instituições já oferecessem cursos de mestrado ou doutorado.
De acordo com Edgar Jacobs, advogado da Associação Brasileira de Instituições de Pós-Graduação (ABIPG), uma escola apta a oferecer mestrado e doutorado não significa necessariamente que também esteja pronta para oferecer uma pós-graduação lato sensu, já que a especialização é voltada para o mercado e não para a academia como são o mestrado e o doutorado. Segundo o advogado, o CNE infringiu a Constituição e a Lei de Diretrizes e Bases ao adotar essa resolução.
Fundamento fragilizado
A ABIPG, representando seus associados, já entrou com 12 ações na Justiça contra o parecer e obteve oito liminares de instituições sediadas em Minas Gerais, São Paulo e no Distrito Federal. A primeira sentença favorável foi para o Centro de Medicina Especializada Pesquisa e Ensino (Cemepe), localizado em Belo Horizonte, e depois vieram as da Escola de Administração e Negócios (Esad) de Brasília; do Hospital Sírio-Libanês; e da Fundação Dom Cabral, entre outras, todas renomadas entidades, essa última inclusive com reconhecimento internacional, eleita em 2011 como a quinta melhor escola de negócios do mundo pelo jornal britânico Financial Times.
Para Marcelo Saraceni, presidente da ABIPG e diretor-geral da Esad, a decisão do MEC foi meramente política. Seraceni ressalta que a medida não foi baseada na qualidade dos cursos, já que muitas entidades atingidas são reconhecidas internacionalmente, seja pela reputação dos professores ou das grades curriculares oferecidas. “O que o Ministério da Educação e o CNE fizeram foi lavar as mãos, alegando falta de recursos financeiros para fiscalizar os programas ministrados fora das universidades, que é uma obrigação constitucional deles”, afirma.
O embasamento jurídico da proibição também é frágil. Segundo Sérgio Cabral Sant’ana, especialista em direito educacional da Covac Sociedade de Advogados, não existe nenhuma norma expressa que proíba essas instituições de se credenciarem de maneira especial. “Portanto, as instituições que estão recorrendo à Justiça têm chances de êxito bem razoável de conseguirem liminares favoráveis”, acrescenta. Para o especialista, o que o MEC fez foi partir de uma decisão para depois fundamentá-la. “É exatamente o inverso do que deve ocorrer sempre, além de não reconhecer o dever do Estado de regular esses cursos de especialização oferecidos”, destaca. Sant’ana recomenda, no entanto, que as instituições atingidas procurem sempre um advogado especializado na área educacional para não optarem por decisões que podem deixá-las cometer ilegalidades sem querer.
Já na época da apreciação do parecer no Conselho Nacional da Educação, a análise dividira os próprios conselheiros votantes. Na opinião de Antonio de Freitas, pró-reitor de Ensino, Pesquisa e Pós-graduação Lato Sensu da Fundação Getulio Vargas, e então conselheiro do CNE, a decisão final foi equivocada. De acordo com ele, foi uma solução pouco lógica em um país que precisa cada vez mais de cursos de qualidade e específicos para melhorar a sua mão de obra especializada. “Partimos de uma solução ruim para uma pior, pois a grande maioria dessas instituições oferece opções de qualidade com professores que são profissionais de currículo e experiências devidamente reconhecidos no mercado, e com cursos que não são ofertados no dia a dia das demais instituições, justamente pela alta especialidade desses cursos”, justifica.
Terceira via
Além da via judicial, pela qual algumas instituições garantiram o direito de continuar ministrando os cursos de especialização, outra alternativa experimentada é a aquisição de instituições de ensino devidamente credenciadas pelo MEC ou mesmo a criação de faculdade própria. Esse foi o caso da Fundação Instituto de Administração (FIA), que se tornou mantenedora de uma instituição de ensino superior, a Faculdade FIA de Administração e Negócios. Mas a maioria dos especialistas ouvidos pela reportagem, no entanto, recomenda cautela na adoção dessa opção, pois o trâmite para o credenciamento de uma instituição de ensino superior é bastante exigente.
Uma terceira via adotada pelas instituições atingidas pelo descredenciamento de seus cursos pelo MEC foi firmar parcerias com outras instituições educacionais que já possuem o devido credenciamento, e que, desse modo, são também autorizadas a emitir certificados de cursos de pós ou MBA. Na verdade, essa é uma estratégia que já era usada antes que o Conselho Nacional de Educação autorizasse oficialmente o credenciamento especial e um dos motivos para a criação dessa prerrogativa.
A ampliação de parcerias para desenvolver a pós-graduação no país é uma saída que beneficiaria esse nível educacional como um todo. “Para que não aconteça apenas a busca por uma barriga de aluguel, é preciso desenvolver essa parceria em toda a gestão acadêmica, com a instituição cedendo seu know-how e mantendo a sua participação na oferta desses cursos de pós-graduação”, sustenta Antonio de Freitas.
Devido papel
Na opinião de Ester Vitale, pró-reitora de pós, pesquisa e extensão da Universidade Cidade de São Paulo (Unicid), destinar a concessão do título oficial de pós-graduação exclusivamente às instituições de ensino superior é uma forma de valorizar o papel delas na formação dos futuros profissionais do país. Ela aprova a decisão do CNE, que, segundo a pró-reitora, veio ao encontro do que as universidades esperavam, devolvendo-lhes um papel que lhes cabe na formação de profissionais especializados para o mercado de trabalho. “Havia um mercado à parte, um desvirtuamento da ideia original desse credenciamento, com vários institutos que eram quase instituições de ensino superior, e com a resolução, as universidades devidamente regulamentadas ocuparam novamente o seu papel. Não era possível continuar deixando que a exceção virasse uma regra”, reforça.
As parcerias também contribuem para a ampliação da participação das instituições no mercado. As áreas mais recorrentes são as de saúde e negócios, já que a certificação da especialização é usada para ascensão profissional dos estudantes, principalmente nas empresas e nos concursos públicos.
É o caso da Unicid, que mantém parcerias com o Instituto Brasileiro de Educação Continuada (Inbec) e a Universidade In Company de São Paulo (Unisãopaulo), entre outros, para o oferecimento de cursos de especialização. Segundo Ester Vitale, de 2012 para 2013 a Unicid teve um aumento de 15% a 20% nas matrículas dos cursos de pós-graduação lato sensu. “Só o Inbec está oferecendo 88% a mais de cursos de especialização com a nossa parceria”, revela.
A chancela do MEC na certificação, no entanto, não é o mais importante para algumas instituições, especialmente as que oferecem cursos de especialização na área de negócios. De acordo com John Schulz, sócio-fundador da BBS Business School, instituição que foi atingida pelo descredenciamento, a reputação da escola é o que conta. “Nossos alunos nos procuram por indicação de empresas ou do próprio mercado, e pela excelência dos nossos professores e da proposta acadêmica. É o suficiente para eles, independentemente da posição e das restrições impostas pelo MEC”, explica Schulz.
Mas a falta de reconhecimento de um órgão oficial de educação ainda pode pesar, especialmente nos casos em que a comprovação da certificação é necessária. Nesse sentido, os especialistas defendem a criação de um selo de reconhecimento e de um modelo de acreditação coordenado por entidades privadas, com parâmetros rígidos, como ocorre há muitos anos nos Estados Unidos e na Europa.