Voltado a docentes, projeto da 29ª Bienal de São Paulo oferece cursos e material para orientar profissionais a realizarem ações educativas
Publicado em 10/09/2011
MONUMENTO AO ANARQUISTA DESCONHECIDO(2007),de Kendell Geers. Exilado político da África do Sul por opor-se ao apartheid, Geers reflete em sua obra o contexto de vandalismo e hostilidade. A imagem do trabalho suscita questões, como: há verdades ou versões diferentes de um mesmo fato? Quem pode ter destruído esse carro e por quê? |
Em 25 de setembro, o Pavilhão Ciccillo Matarazzo, no Parque do Ibirapuera, abre as portas para receber os visitantes da 29ª Bienal de São Paulo, cujo título é inspirado no verso do primeiro canto da obra
Invenção de Orfeu
(1952), do poeta alagoano Jorge de Lima. "Há sempre um copo de mar para um homem navegar" resume o que a exposição quer afirmar, segundo dizem os curadores, Agnaldo Farias e Moacir dos Anjos: a dimensão utópica da arte está contida nela mesma. Além disso, a ideia de que é impossível separar a
arte
da
política
é a principal base da mostra deste ano.
Para facilitar o diálogo entre os participantes e as obras, o Projeto Educativo da Bienal convida o público a investir nas suas próprias percepções dos trabalhos em exposição. Desde fevereiro, o projeto desenvolve atividades de formação com o propósito de discutir estratégias de aproximação com os artistas e conteúdos da mostra. Mais de 10 mil professores das redes pública e privada já participaram e a expectativa é chegar a 35 mil. O curso a distância já atendeu cerca de 7,5 mil professores de arte da rede estadual paulista.
Para ampliar o alcance do projeto, foi elaborado um material educativo dirigido especialmente a professores, educadores, líderes comunitários e outros profissionais dedicados à formação de crianças, jovens e adultos. Composto por um livreto sobre a exposição, trinta fichas sobre artistas, seis fichas sobre os
terreiros
, seis cartazes de obras e um jogo de tabuleiro, o material educativo é distribuído gratuitamente aos participantes dos encontros de formação.
Para a professora de arte e participante do curso Maria de Fátima Basílio, o material possibilita abordar a arte contemporânea de maneira palpável. "É uma boa ‘chave’ para acessar o interesse dos alunos pela exposição, já que vem com sugestões úteis", diz. A também arte educadora Ana Claudia Vicentin do Rêgo elogia o material por ser rico em informações e propostas pedagógicas. Porém, sugere a montagem de uma apostila com referências dos vídeos, imagens e artistas em exposição. "Dessa forma, poderemos consultá-los para utilizar nas aulas", acrescenta.
Segundo a curadora educacional desta edição, Stela Barbieri, os materiais educativos estão em sintonia com as concepções educativas da Bienal e têm a proposta de cooperar e convidar públicos variados para uma formação estética. É um trabalho dialógico no qual o participante responde às questões propostas e sugere outras. Apesar da longa trajetória de grandes projetos educativos, é a primeira vez que a Bienal elabora um programa extenso como este. "É raro uma situação como essa, em que um projeto de Bienal se faz em equilíbrio e com uma intensa colaboração entre os envolvidos", observa Stela.
As bases do projeto
Estruturado em oito eixos, o Projeto Educativo da 29ª Bienal visa proporcionar circunstâncias diversas para a interação de públicos variados. São encontros com curadores, artistas e outros profissionais; visitas orientadas para o público escolar e não escolar; um seminário internacional de Educação, Arte e Política; cursos para educadores que orientarão o público na mostra e para crianças, jovens, docentes e demais interessados.
Há três tipos de ações para os eixos: formação para escolas públicas e particulares, presenciais e a distância; em ONGs e comunidades de bairro e os chamados
terreiros
, que ocorrem dentro da programação dos seis espaços de convívio e reflexão da Bienal e cujos nomes derivam de questões específicas que orientam a exposição e destacam a presença e a importância da arte no dia a dia:
A pele do invisível; Dito, não dito, interdito; Eu sou a rua; Lembrança e esquecimento; Longe daqui, aqui mesmo; e O outro, o mesmo
.
A ideia dos terreiros é criar espaços de convivência para os visitantes. Inspirados nos espaços de celebração, cada um deles tem endereçamento e missão específicos. As programações variam de acordo com o terreiro: são instalações com cinema, palestra, áreas de descanso etc.
Sem a intenção de hierarquizar as cerca de 200 obras de 148 artistas, a Bienal pretende aproximar trabalhos recentes daqueles realizados em décadas passadas, com o objetivo de destacar sua importância para a compreensão do mundo atual. As obras tratam de assuntos políticos, sociais, estéticos, éticos e filosóficos, abordando aspectos inerentes à vida contemporânea e propondo ao visitante novas possibilidades de enxergar um mundo em mutação constante.
Discutindo e aprendendo
A formação oferecida pela Bienal de São Paulo é dividida em quatro partes. A primeira tem o propósito de apresentar o material educativo, instruindo o professor e o educador a tirar maior proveito do conteúdo, como o jogo de tabuleiro e as fichas de obras e artistas. A segunda parte traz um aprofundamento nos trabalhos de artistas selecionados para a mostra. No curso de férias, por exemplo, são exibidos vídeos (60% dos trabalhos da Bienal utilizam esse meio), sobre o qual se realizam reflexões e debates, seguidos de uma ação poética para criar um jogo para dez pessoas. Já a terceira parte é constituída pela visita orientada à exposição, exclusiva para professores, e a fase final é a visita orientada com os alunos.
Para Guilherme Teixeira, formador no Projeto Educativo da 29ª Bienal, a Ação Poética é a etapa mais importante. "Ela proporciona uma experiência concreta com o fazer artístico, prática da qual, infelizmente, muitos professores estão afastados", opina.
Em um dos cursos de férias, alguns docentes falaram sobre suas dificuldades de encontrar uma metodologia para tratar da arte contemporânea em sala de aula. O fato de esse assunto provocar diferentes reações, mesmo entre professores de artes, chamou a atenção de Maria de Fátima Basílio. "Isso me levou à seguinte reflexão: Como trabalhar o aluno do século 21 de modo que ele não fique preso na arte do passado? Quais ações são necessárias para o aluno transitar do passado ao presente da arte?", questiona. Ela acredita que os cursos teriam um aproveitamento melhor se mais pessoas tivessem afinidade com a arte contemporânea. "Por sermos professores de arte (grande parte dos participantes) há um pressuposto de que a relação com a arte contemporânea faça parte do nosso dia a dia, o que não é real", finaliza.
Após a exibição no curso de vídeos do Projeto Mutirão, de Graziela Kunsch, uma participante questionou o motivo pelo qual os trabalhos eram considerados arte. A pergunta abriu espaço para uma discussão que pode ser relevante na visita com os estudantes. Na opinião do formador Guilherme Teixeira, para romper a barreira entre o público e a obra de arte contemporânea é preciso haver uma aproximação com artistas e instituições. "Talvez os programas educativos sejam a melhor forma de fazê-lo. Mas o público também deve fazer a sua parte e deixar de lado os preconceitos e a preguiça", nota.
A pedagoga Vanessa dos Santos e a educadora Andresa Fornazieri, do Centro Social Nossa Senhora do Bom Parto, já participaram de dois cursos. Elas criaram uma nova maneira de utilizar o material educativo da Bienal: baseando-se na leitura de um texto, propõem ao educando que ilustre sua ideia e crie a própria ficha técnica do desenho. Essa atividade socioeducativa tem o objetivo de trabalhar a criatividade e a imaginação por meio da arte da ilustração e da escrita. "Com isso inserimos o educando no assunto de maneira mais lúdica", esclarece Vanessa, que ensina crianças de 6 a 14 anos.
29ª Bienal de São Paulo |
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Para mais informações sobre os cursos e agendamento de visita com a escola, acesse o minisite do projeto educativo da Bienal de São Paulo: |